A evolução dos peixes do gelo (canictiídeos): Uma história molecular de perdas, modificações e inovações.
Um registro histórico das mudanças ocorridas nas linhagens ao longo do tempo pode ser recuperado não somente através dos fósseis, como também através do DNA das espécies remanescentes. A história dos peixes do gelo antárticos talvez seja o exemplo que ilustra melhor esta forma de investigar a evolução.
O biólogo do desenvolvimento especializado em EVO-DEVO, Sean B. Carroll, em seu excelente “The Making of the Fittest: DNA and the Ultimate Forensic Record of Evolution.” nos oferece alguns exemplos fantásticos de como essas evidências corroboram maravilhosamente a evoluçào biológica. Esta linha de investigação nos permite estudar em grandes detalhes o processo de descendência com modificação, rastrear seus passos e os mecanismos por ele responsáveis. Estas e outras evidências tornam a evolução biológica inegavelmente a base da atual diversidade biológica, corroborando este fenômeno muito além de qualquer dúvida razoável. Porém, aquilo que é fato estabelecido para a comunidade cientifica é ainda alvo de incredulidade por uma porção significante da população. Perplexo com esta situação, Carroll nos oferece a seguinte comparação:
Embora boa parte da população dos EUA não pareça ter quaisquer problemas com as técnicas de análise e comparação de DNA utilizadas em estudos de paternidade, genética histórica e na investigação criminal, quase metade desta mesma população não aceita a evolução dos seres vivos que usa além de várias outras linhas de evidência, a análise do DNA.
A evidência molecular revelada nas últimas décadas, intensificada pelos projetos de sequenciamento de genomas e as outras 'ômicas' que se originaram a partir deles, apenas confirmam, em um grau elevadíssimo de detalhe, o que outras formas de evidência já mostravam há mais de um século:
A evolução é uma realidade e seu estudo é cada vez mais importante em áreas como o estudo de patógenos e pragas vegetais e animais, na biologia da conservação, especialmente, no que se refere aos estoques naturais de espécies de interesse comercial como peixes, além de estarem na base da pesquisa biomédica e pesquisa biológica básica.
Este artigo tem como base um dos incríveis casos que Carroll usa em seu livro como ilustração das evidências forenses trazidas à tona pela análise do DNA. Os peixes do gelo são um dos exemplos mais interessantes do processo de evolução e das maneiras pelas quais ele é estudado.
Perdas:
Transparente como o sangue?
No começo do século XX durante as primeiras explorações do continente gelado, zoólogos depararam-se com um fantástica exceção aos compêndios de história natural, um vertebrado com sangue transparente, sem hemácias e sem hemoglobina.
O mais espetacular desta descoberta é que a hemoglobina é uma proteína extremamente importante em todos os demais vertebrados conhecidos. Sendo formada por quatro cadeias polipeptídicas (no adulto formadas pelos produtos de dois genes referentes às cadeias da α- e β-globinas), ligadas a um pequeno anel porfirínico, o grupo heme, que desempenha uma função chave ao transportar O2 e CO2 no nosso sistema circulatório, dos alvéolos pulmonares para os tecidos, no caso do O2, e dos tecidos aos alvéolos no caso do CO2. Esses peixes não possuíam uma molécula, até então, considerada essencial a todos os vertebrados e até hoje constituem-se a única exceção conhecida a ubiquidade das hemoglobinas nos vertebrados. [Ao lado, o agregado biológico 1 de uma hemoglobina . PDB 1GZX - Hemoglobina no estado OXY T, ligada ao oxigênio pelos quatro grupos heme].
Essa linhagem de peixes, formada por cerca de 17 espécies da família Channichthyidae ou peixes-do-gelo (Icefish), são uma entre oito famílias da subordem Notothenioidei, que, por sua vez, pertencem a ordem Perfiforme. Os membros desta subordem ocupam o mais frio dos ambientes marinhos que é, ao mesmo tempo, o mais termicamente estável da face da terra. Neste ambiente, as temperaturas em certas regiões, como no mar próximo à plataforma de gelo Ross, na Antártida, são quase constantes, permanecendo por volta dos -1,9 °C por todo ano ,mas mesmo em regiões mais ao norte da península Antártica, em que as temperaturas variam mais, elas oscilam apenas entre os 1,5 °C positivos do verão e os -1,8 °C do inverno. Os nototenióides representam algo em torno de 35% das espécies de peixes ao sul da frente polar Antártica, mas constituem cerca de 90% da biomassa de todos peixes ali existentes. Por isso este grupo é considerado dominante nessas águas, estando seus representantes muito bem adaptados a condições extremas que ali imperam.
Esta incrível descoberta, entretanto, poderia ter permanecido sem explicação já que não se esperam encontrar informações deste tipo no registro fóssil. Felizmente a evolução molecular também deixa suas marcas, através daquilo que Carroll chama de “fósseis moleculates”, restos de [pseudo]genes que persistem nos representantes vivos de uma dada linhagem e que guardam pistas sobre o passado evolutivo de seus ancestrais. Como os fósseis reais expostos as intempéries, essas relíquias podem ser rapidamente 'erodidas'. Não pela chuva ou pelos ventos, mas pela ação de mutações que constantemente bombardeiam os genomas dos seres vivos e que normalmente seriam purgadas pela seleção natural, mas que na ausência de funções que impactem na aptidão dos organismos associadas as regiões onde estas mutações incidem, acabam por torná-las 'invisíveis' a seleção natural.
Ao analisar os genomas dessas criaturas foi possível constatar que havia ainda cópias não funcionais dos genes (pseudogenes) de uma das globinas, os da α-globina, que ainda são relativamente reconhecíveis, mas o outro, que normalmente estaria disposto no mesmo cromossomo ao lado do outro gene (o da β-globina), já não pode ser mais reconhecido, tendo sido degradado pelo acúmulo de mutações (Cocca et al., 1995); Esses “fósseis genéticos” nos permitem inferir que durante a evolução desses peixes, cuja subordem inclui peixes com a hemoglobina, houve realmente a perda da capacidade de expressar esta molécula [Para ver detalhes clique na figura abaixo à direita].
Ao sobrepor as filogenias e as estimativas desses eventos mutacionais ao registro geológico, pode-se observar que este processo deve ter ocorrido após a separação do continente antártico da América do Sul, através da tectônica de placas, e em consonância com as mudanças de temperatura em função de alterações climática e dos padrões de correntes marítimas.
Este estranho fenômeno pode ser parcialmente explicado por certos fatores físicos associados ao ambiente gelado no qual vivem esses animais, e no qual seus ancestrais evoluíram ao longo de milhões de anos conforme as condições tornaram-se cada vez mais rigorosas. Um desses fatores envolve um afrouxamento em certas pressões seletivas e o outro constitui-se em uma nova pressão seletiva que, em conjunto, nos ajudam a compreender por que a hemoglobina pode ser parcialmente dispensável.
Águas geladas e salgadas como as da Antártida são ricas em O2. Isso acontece por nestas condições o oxigênio torna-se mais solúvel, o que diminui as demandas dos sistemas branquiais e circulatórios dos animais que ali vivem. Por outro lado, a menor temperatura aumenta a viscosidade dos fluidos, tornando o processo de bombeamento ativo do sangue algo tremendamente custoso. Por isso, nestas condições não só seria possível, como talvez até útil, a diminuição da viscosidade do sangue.
Esta ideia é apoiada pelo fato de outros peixes da ordem Notothenioidei possuírem hematócritos baixos, ou seja, a relação entre a proporção de células vermelhas e o volume de sangue bem mais baixa do que a de outros vertebrados. Enquanto nosso hematócrito está por volta de 45%, muitos desses peixes têm hematócritos tão baixos como 18%. Este fato levou vários cientistas a especularem, compreensivelmente, que os peixes-do-gelo, da família Channichthyidae, seriam apenas um exemplo extremo de uma tendência evolutiva maior para diminuição da viscosidade do sangue, já que seu hematócrito é o menor existente estando por volta de 1%, todo composto por células brancas (di Prisco, Cocca, Parker, Detrich, 2001). Mas algumas diferenças na natureza dos eventos - como o caso da diminuição de hematócrito nos demais nototenióides ter dependido de mudanças na regulação da expressão de genes, diferentemente das mudanças nos nototenióides da família Channichthyidae, que ocorreram a partir de deleções gênicas completas - sugerem que algo um pouco mais complicado deve ter se sucedido na evolução da perda das hemácias e da hemoglobina (Sidell, O'Brien, 2006).
Na verdade, estimativas com dados de trabalho cardiovascular e gasto energético desses animais sugerem que, no final das contas, a perda por parte dos nototenióides de células vermelhas e de hemoglobina poderia ser mais desvantajosa do que vantajosa (Sidell, O'Brien, 2006). Talvez simplesmente não compensassem os ganhos com a diminuição de viscosidade.
O que realmente parece bem estabelecido, entretanto, é que o impacto de tais mudanças seria realmente muito minimizado pela abundância e grande estabilidade na oferta de O2 propiciada pela sua alta solubilidade em águas geladas salgadas, inclusive em várias profundidades diferentes graças ao alto fator de mistura vertical dessas águas.
Então, a história parece um pouco mais complicada e interessante, mesmo porque as alterações de hematócritos em nototenióides e a perda total da expressão de hemoglobina na família Channichthyidae não foram as únicas mudanças sofridas por esses peixes antárticos, como veremos mais adiante.
Ainda falando sobre perdas, entretanto, a hemoglobina não foi a única molécula que esses animais deixaram de expressar. Nenhum do nototenióides investigados até o momento (pelo menos até 2006 de acordo com Sidell e O'Brien, 2006) expressa outra molécula, similar a hemoglobina, em sua musculatura esquelética, a mioglobina.
A mioglobina [imagem: Agregado biológico 1 do PDB 1A6M - OXI-MIOGLOBINA,] é uma proteína associada ao armazenamento e transporte intracelular de O2, cujas cadeias polipeptídicas são muito semelhantes as globinas que formam o tetrâmero da hemoglobina. De fato, seis espécies de canictiídeos também não a expressam nem ao menos em seus seus corações. A mioglobina é outra proteína comum em vertebrados, que pode normalmente ser encontrada nas células musculares.
A falta generalizada da mioglobina na musculatura esquelética dos nototenióides (e específica nos corações de certos canictiídeos) levantou a suspeita que tal molécula poderia não funcionar de maneira adequada nas baixas temperaturas, tornando-se, portanto, mais dispensável, ou até mesmo um estorvo. Desta maneira poderia ter sido expurgada pela seleção natural. Porém, estudos fisiológicos com as mioglobinas de peixes que vivem em águas geladas mostram que a zero graus elas comportam-se de forma equivalente a de peixes e animais de zonas temperadas e tropicais por volta de 37°C. Aqui mais uma vez não parece ter existido uma vantagem imediata, apenas uma diminuição de custo adaptativo associado ao contexto climático, ecológico e geológico da evolução desta subordem de peixes.
Outros fatores contingentes também permitiram a evolução desta família de peixes ósseos nestas condições. Entre eles estão o fato deste grupo de peixes apresentarem baixas taxas metabólicas absolutas, parte, em função de sua temperatura corporal, mas também por causa de sua pouca atividade locomotória resultante de descenderem de ancestrais de fundo pouco ativos. Essa demanda energética diminuída deve ter caído como um luva nos ancestrais dessas criaturas que puderam mais facilmente adaptar-se as condições dos mares antárticos que iam se estabelecendo.
Aĺém desta baixa demanda metabólica inicial, outras condições enfrentadas pelos ancestrais nototenióides - no começo de sua expansão e diversificação pelos ainda não tão frios mares antárticos - também tiveram um importante papel em sua evolução posterior que se deu de maneira bastante rápida, em termos relativos, nos últimos 12 milhões de anos. Entre elas podemos citar:
Esta linhagem evoluiu em isolamento oceanográfico relativo de outras faunas devido às correntes circumpolares e a existências de profundas fossas oceânicas ao redor do continente antártico;
As baixíssimas temperaturas do oceano antártico nos últimos 10-14 milhões de anos que deve ter restringido outros grupos de colonizarem e diversificarem-se no mesmo período; e
Níveis muito baixos da concorrência como consequência de uma drástica redução da fauna de peixes, por volta do final do terciário, que abriu o caminho para os ancestrais dos nototenióides recomporem os 'estoques naturais' ancestrais de peixes, colonizando cerca de 10% do volume mundial dos oceanos.
Por fim, várias evidencias mostram que o resfriamento climático da Antártida durante os últimos 25 milhões de anos não foi sempre contínuo, com muitos dados sugerindo que enseadas marinhas profundas (a mais de 100 m) desenvolveram-se durante períodos de recessão do escudo glacial, mesmo durante os últimos 5 milhões de anos. Estas enseadas profundas, podem funcionado como refúgios, a partir dos quais novas ondas de colonização de novos habitats polares e diversificação acontecerem, explicando esta radiação excepcionalmente rápida das várias espécies nototenióides, inclusive com a fixação de linhagens sem hemoglobina e mioglobina [veja mais sobre isso mais adiante].
Contudo, mesmo com grande oferta de O2, os peixes-do-gelo apresentam apenas cerca de 10% da capacidade de carreamento de O2 exibida pelos demais nototenióides com hemácias. Por isso, outras adaptações compensatórias se seguiram na forma de mudanças cardiovasculares que permitiram a estes organismos evoluir nas condições das águas antárticas.
Entre essas modificações, que podem ser facilmente destacadas, temos: (i) a posse de corações muito grandes comparados aos dos parentes nototenióides de sangue vermelho (mas de tamanho corporal similar) o que resultam em uma ejeção cardíaca peso-específica até cinco vezes maior do que a dos outros nototenióides e volumes de sangue até quatro veze maiores; (ii) os diâmetros dos capilares dos peixes-do-gelo são realmente muito grandes, o que, em conjunto com as demais características, permite que um grande volume de sangue circule por todo o corpo, em alto fluxo e à baixa pressão que se deve à diminuição da resistência periférica; (iii) posse de tecidos muitos mais vascularizados, especialmente os tecidos retinianos e do as escamas desmineralizadas que aumentam a capacidade de absorção de oxigênio; e (iv) mitocôndrias em maior densidade dentro dos tecidos especialmente naqueles com altas demandas oxidativas, como a musculatura esquelética e cardíaca.
Porém, como enfatizam os pesquisadores Bruce Sidell e Kristin O’Brien (2006) - caso tenha sido realmente o efeito do relaxamento da seleção natural, em função da baixa competição inter-específica, e a vicariância oceanográfica que permitiram a perda da hemoglobina e da mioglobina nesses peixes - o que mais especificamente teria impulsionado as adaptações fisiológicas compensatórias que se seguiram a perda de expressão dos genes dessas proteínas da família das globinas. Como estes autores fazem questão de enfatizar, tais características compensatórias são em grande número e podem ser observadas em todos os níveis de organização biológica. Mas longe de ser um mistério insondável, várias pistas apontam para uma solução bem simples, na forma de outra característica muito difundida entre os organismos multicelulares e que vem sendo cada vez mais reconhecida como fundamental para a evolução desses organismos. Uma característica que permite a 'evolucibilidade' ( como preferem alguns, do termo em inglês 'evolvability', isto é, a 'evolução da capacidade de evoluir'), a chamada plasticidade fenotípica. [Mas isso é um assunto para um outro post sobre os peixes-do-gelo.]
Contudo, este artigo não acaba aqui, já que a história evolutiva dessas impressionantes criaturas é ainda mais fascinante, pois além da perda de moléculas (em outras circunstâncias cruciais) durante sua evolução, também ocorreu a modificação de outras moléculas e a “invenção” de moléculas completamente novas, aumentando o “conteúdo informacional” dos seus genomas, fato esse que permitiu a estes organismos adquirirem novas funções, coisas que deveriam ser impossíveis de acordo com certos movimentos anti-evolucionistas.
Modificações:
Os microtúbulos também sofrem com o frio:
As células dos eucariontes - o domínio que inclui, além dos animais, plantas, fungos e protistas - possuem um complexo arcabouço estrutural constituído por diversas proteínas que formam o que é compreensivelmente denominado de 'citoesqueleto'. Este sistema confere forma aos diversos tipos celulares dos organismos multicelulares, além de permitir os movimentos de células individuais e de tecidos complexos; sendo, portanto, fundamentais em processos como a meiose e a mitose.
Uma das principais moléculas que compõe o citoesqueleto (em conjunto com a actina e os filamentos intermediários) são os microtúbulos, longas moléculas protéicas formadas pela polimerização de proteínas menores denominadas tubulinas.
O problema é que os microtúbulos da imensa maioria dos vertebrados não funcionam muito bem abaixo de certas temperaturas, perdendo a capacidade de se polimerizarem. Mas isso não ocorre com os microtúbulos dos peixes antárticos, como os peixes-do-gelo e seus outros parentes da subordem Notothenioidei. Estes peixes exibem algumas modificações que fazem com que seus microtúbulos funcionem bem mesmo em baixas temperaturas como as experimentadas nos mares antárticos (Carroll, 2006).
Os peixes nototenióides também mostram muitas outras adaptações ao nível molecular que capacitam-nos para a vida em baixas temperaturas. Muitos estudos têm mostrado que várias dessas modificações adaptativas que envolvem substituições de aminoácidos que conferem maior flexibilidade às proteínas (Rogers, 2007).
A seqüência primária das β-tubulinas da classe II nas espécies de nototenióides estudados contém substituições singulares de resíduos de aminoácidos que aumentam a hidrofobicidade e a flexibilidade das cadeias polipeptídicas, dois fatores que favorecem a formação de microtúbulos em ambientes pobres em energia. Alterações similares também foram descritas nas cadeias polipeptídicas de outras α- e β-tubulinas destas espécies. Além disso, outro desafio a expressão e bom funcionamento dos microtúbulos em condições semelhantes as que vivem os peixes antárticos relaciona-se a síntese de quantidades suficientes de α- β- tubulinas de maneira que atinjam as concentrações críticas celulares de dímeros de tubulina (Parker, Detrich, 1998).
Entre essas adaptações poderíamos incluir o aumento no número de genes para α- β- tubulina, além de alterações na própria organização destes genes em unidades mais eficientemente transcritas, conjuntamente com a evolução de elementos promotores, reforçadores, RNAs polimerases e fatores de transcrição e de sistemas de estabilização mRNA também mais eficientes. De fato várias evidencias nos levam a crer que foi exatamente isso que aconteceu (Parker, Detrich, 1998).
Os exons, íntrons e regiões não traduzidas de genes de certas α-tubulinas existentes nesses peixes são notavelmente similares entre si em termos das seqüências; e as regiões intergênicas entre estes genes são significativamente palindrômicas, sugerindo que este grupo de genes intimamente relacionado deve ter acontecido por duplicação, inversão e divergência de um gene de α-tubulina ancestral. Portanto, em função dessa e de outras observações os cientistas propuseram que a adaptação ao frio do sistema de microtúbulos de peixes antárticos se deu, pelo menos em parte, através da expansão das famílias de genes para α- β- tubulinas que ajudaram a garantir a síntese eficiente desses polipeptídeos, além é claro das modificações que aumentaram a flexibilidade dessas proteínas (Parker Detrich, 1998)
Alguns exemplos de outras proteínas que também passaram por esse tipo de mudanças características são:
Lactato desidrogenase A4 (enzima envolvida na respiração celular)
Tripsinas (enzimas digestivas),
Sec61p (um transportador de proteínas presente na membrana do retículo endoplasmático,)
Inovações:
Anticongelantes e digestão:
O mais surpreendente, entretanto, talvez seja o fato que estes peixes possuem uma proteína não existente em outros vertebrados (ainda que existam proteínas com seqüencias e características estruturais diferentes que desempenham papéis equivalentes em animais muito diferentes) que cumpre o importante papel de impedir que o sangue desses animais congele, inibindo o crescimento de cristais de gelo. A evolução de glicoproteínas anticongelantes neste grupo de animais é uma das mais fantásticas adaptações moleculares que conhecemos e serve de exemplo para os caminhos tortuosos e para o jogo de bricolagem que caracterizam a evolução biológica.
O mar antártico é muito frio, como é bem sabido por todos, mas por causa de sua salinidade mantem-se líquido mesmo alguns graus abaixo da temperatura de congelamento da água doce. No entanto, mesmo assim, pequenos cristais de gelo podem formar-se nestas condições funcionando como “sementes” no processo de nucleação e formação de gelo no corpo dos animais que vivem nessas águas, algo que pode ocorrer tanto no sistema digestório como na corrente sanguínea desses animais, levando a destruição tecidual.
As proteínas anticongelantes foram identificadas décadas atrás no plasma sanguíneo de peixes da Antártida por Arthur DeVries e seus colegas. Cerca de 120 espécies de peixes pertencentes à subordem Notothenioidei possuem em seus tecidos e corrente sanguínea estas moléculas anticongelantes conhecidas como AFGP, isto é, "AntiFreezen GlicoProteins" que em português, significa 'glicoprotéinas anticongelantes'.
Essas proteínas têm uma estrutura incomum, composta por motivos repetidos que permitem sua ligação aos cristais de gelo e bloqueio do seu crescimento, diminuindo assim a temperatura mínima para o crescimento desses cristais para cerca de -2,2oC. abaixo da temperatura mínima do oceano antártico e, por volta, de um grau a menos do que o ponto de congelamento do plasma de peixes que não produzem este tipo de anticongelante. Um diferença mínima mais que teve consequências ecológicas profundas, com os peixes produtores da proteína anticongelante dominando hoje as águas da Antártida (mais sobre isso no final do artigo).
Aqui, mais uma vez, a 'evidência forense' do DNA cumpriu um papel chave na elucidação deste mistério evolutivo. Esta proteína possui uma boa similaridade, em certos trechos com uma enzima digestiva pancreática.
A proteína anticongelante desses peixes antárticos é composta por seqüências simples repetidas de tripeptídios que evoluíram a partir de um enzima similar ao tripsinogênio, uma enzima digestiva, surgida através do recrutamento dos segmentos 5' e 3' terminais deste gene ancestral que provê ao gene da nova proteína, respectivamente, o sinal de secreção e a região não traduzida (UTR), juntamente com a ampliação de novo de um elemento formado por 9 pares de bases responsáveis pela codificação de segmentos formados pelos resíduos treonina, alanina e alanina (Thr-Ala-Ala*) também derivados de um progenitor tripsinogênico.
Estes segmentos tripeptídicos (Thr-Ala-Ala) é que dão origem a região da nova proteína que codifica para a 'espinha dorsal' da proteína anticongelante. Há pelo menos oito formas destas glicoproteínas de diferentes tamanhos (AFGP 1-8), todas compostas das mesmas repetições deste monômero 'glicotripeptideo' simples com um dissacarídeo ligado a cada resíduo de treonina (Cheng, Chen, 1999).
No começo da pesquisa sobre essas proteínas, eram conhecidos apenas os genes que codificavam três das oito isoformas, das poli-proteínas AFGP dos nototenióides, apenas referentes as isoformas pequenas (AFGPs 6, 7 e 8), cujos genes são codificados isoladamente. O grupo de Chen (Chen, DeVries, Cheng, 1997; Cheng, Chen, 1999) resolveu, então, investigar se as isoformas maiores (AFGPs 1-5) também eram codificadas, individualmente, ou em bloco, e para isso analisou uma biblioteca genômica obtida de exemplares Dissostichus mawsoni (o gigante da Antártida "Toothfish"), da qual conseguiu isolar um 'clone', Dm7M, que continha, além de uma porção bastante peculiar que, não só codificava uma isoforma maior da AFGP isoformas, umas também continha o código para uma protease tripsinogênica em tandem, isto é, contígua a porção que codificava a AFGP (Cheng, Chen, 1999).
Estes genes quiméricos que codificam tanto uma glicoproteína anticongelante (AFGP) como a protease no sangue de peixes da Antártida da subordem notothenioide, ajudaram a corroborar ainda mais a hipótese da origem da AFGP a partir de uma protease pancreática, mostrando inclusive vários dos passos através dos quais isso teria ocorrido ao longo da evolução. Como quimeras dos genes AFGP-protease também existem em outras espécies de peixes deste grupo, parece claro que a sequência AFGP começou como uma pequena parte integrante do gene da protease ancestral que acabou por se expandir adquirindo independência, vindo a dominar a maior parte da sequência da protease ancestral. A figura em seguida ilustra esquematicamente alguns dos principais componentes moleculares na evolução do gene AFGP a partir do gene da protease em peixes nototenióides antárticos (Cheng, Chen, 1999).
Em resumo, o gene AFGP dos nototenióides surgiu do recrutamento da porção anterior (exon E1 e intron I1) e posterior (E6) de um gene de uma protease ancestral, da criação de novo da região codificadora AFGP através de duplicações repetidas dos elementos codificadores do tripeptídio Thr-Ala-Ala que perfaz a junção I1-E2 do gene protease (aumentada entre b e c), e supressão da maior parte da sequência de protease (E2-I5) (Cheng, Chen, 1999).
Certas espécies de bacalhau do ártico também exibem um motivo tripeptídico repetitivo idêntico (Thr-Ala-Ala) em suas próprias AFGP, mas que não está de nenhuma forma relacionado com o gene do tripsinogênio, evidenciando uma origem evolutiva convergente (Chen, DeVries, Cheng, 1997).
As treoninas das repetições Thr-Ala-Ala das AFGPs em ambos os peixes são O-ligadas a galactosil-N-acetilgalactosamina. As estruturas tripeptídicas regulares repetidas garantem o posicionamento adequado dos dissacarídeos para a ligação aos cristas de gelo: a periodicidade na glicoproteína anticongelante corresponde a periodicidade das moléculas de água na 'rede de gelo'. Em outras palavras, os peixes do Ártico e da Antártida adaptaram-se às baixas temperaturas de forma independente, mas, através de evolução convergente, chegando à mesma seqüência ativa para suas proteínas anticongelantes, mesmo usando genes diferentes como base.
A pouca divergência entre as seqüências AFGP e a dos genes do tripsinogênio (4-7%) dos peixes deste grupo indicam que o processo de conversão de um gene de uma proteinase para um novo gene da proteína de ligação ao gelo ocorreu há relativamente pouco tempo, consistentemente com os tempos de início do congelamento do oceano antártico e da principal divergência filética das famílias notothenioideos que carregam as AFGPs.
Segundo Chen (Chen, DeVries, Cheng, 1997; Cheng, Chen, 1999) a conversão, nos notothenioideos, do gene do (semelhante ao) tripsinogênio para AFGP é o primeiro exemplo claro de como um gene que codifica uma proteína ancestral pode gerar um gene que codifica uma proteína completamente nova que desempenha também uma nova função, constituindo-se em uma história em que a evolução de proteínas, a adaptação do organismo, e as condições ambientais podem ser todas diretamente correlacionadas:
“Ao capturar os intermediários evolutivos quiméricos, temos uma visão rara da gênese de uma nova proteína que, em última análise permitiu a subordem Notothenioidei a ascender a dominância nos oceano austral gelado.” [Cheng CH, Chen L. Evolution of an antifreeze glycoprotein. Nature. 1999 Sep 30;401(6752):443-4. PubMed PMID: 10519545.]
Ainda mais surpreendente é outra evidência que reforça mais esta conclusão. A proteína anticongelante dos peixes desta subordem, uma molécula cujo locus de ação principal acreditava-se ser a corrente sanguínea estando presente no soro desses animais, diferentemente de outras proteínas anticongelantes, não é produzida no tecido hepático e liberada como secreções endócrinas, mas é produzida no pâncreas como sua proteína meia-irmã/ancestral similar ao tripsinogênio, apenas depois transportada à circulação sanguínea. Este arranjo inesperado é exatamente o que se espera de um processo contingente e oportunista como a evolução biológica mesmo que pressões seletivas estejam atuando sobre os organismos em questão (Cheng, Cziko, Evans, 2006).
Além disso, a permanência intacta desta proteína no trato gastrointestinal também sugere que ela desempenhe um papel importante na evitação de danos causados pelo congelamento deste sistema. Os pequenos cristais de gelo presentes no mar podem tornar-se um perigo caso sejam ingeridos e induziam a formação de cristais maiores dentro do animal que poderiam danificar seus tecidos. Esta constatação também nos permite vislumbrar que as AFGPs podem ter evoluído primeiramente como resultado das pressões para a evitação de congelamento e minimização de danos do trato gastrointestinal, apenas posteriormente co-optadas para as funções de proteção dos tecidos corporais associados a circulação sanguínea.
O papel das AFGPs na radiação adaptativa dos peixes nototenióides na Antártida:
As radiações adaptativas são geralmente deflagradas por algum tipo de oportunidade ecológica que surge a partir (a) colonização de um novo habitat pelo seu progenitor, (b) extinção de concorrentes, ou
(c) o surgimento de uma inovação evolutiva fundamental na linhagem ancestral (Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Os primeiros dois fatores são congruentes com o que os cientistas puderam averiguar sobre a evolução desta subordem de peixes. A contração das populações de nototenióides em refúgios durante os ciclos de avanço e recuo das massas de gelo glaciais e a subseqüente especiação alopátrica devido a fragmentação de habitats devem ter sido alguns dos fatores promotores da grande radiação adaptativa vivenciada por este grupo de animais, especialmente a de famílias como a Channichthyidae. Alguns desses eventos podem ter ocorrido em termos relativos recentemente, nos últimos 100000 anos, sendo que alguns desse refúgios podem ter incluído ilhas do marítima e sub-antárticas, além de áreas livres de gelo da plataforma continental (Rogers, 2007; Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Mas além da ocupação de 'nichos vagos' devido a colonização de novos ambientes e da extinção prévia de potenciais competidores, o terceiro fator, a hipótese da inovação chave através da evolução das AFGPs é um dos principais candidatos como explicação inicial para a radiação adaptativa destes peixes nas águas geladas do continente antártico. No entanto, para que este fator realmente se imponha como o elemento deflagrador é fundamental que, para início de conversa, haja a concordância entre a radiação desta subordem de peixes e o começo das alterações nas condições glaciais do mar antártico (Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Como as glicoproteínas anticongelantes estão presentes em quase todos os notothenióides dos grupos monofiléticos antárticos e em nenhum dos táxons 'irmãos' mais intimamente relacionados, e sua estrutura química ser altamente conservada, nos faz concluir que as AFGPs evoluíram apenas uma vez neste grupo de peixes e que, portanto, este evento dever ter acontecido em um ancestral comum, antes do início da diversificação do táxon em que estão os nototenióides antárticos.
As temperaturas da águas antárticas no período cenozóico e durante o surgimento de gelo marinho nesta região podem ser inferidos a partir dos registros de isótopos de águas profundas e da análise de
sedimentos retirados dos núcleos perfurados. O maior problema é estimar o tempo da radiação nototenióides, em si, o que é, em parte, resultado da escassez de fósseis na Antártida.
As estimativas para a evolução deste gene variam, com as mais antigas colocando este evento em algo por volta de 5 a 14 milhões de anos atrás; mas mais recentemente, a origem das famílias dos nototenióides que carregam genes da AFGP foi estimado como tendo ocorrido cerca de 24 milhões de anos atrás, como os tempos de divergência inferidos da análise filogenética dos rDNA 12S e 16S mitocondriais. Estas últimas estimativas, no entanto, foram calibradas pela datação de um único fóssil, cuja identidade é ainda controversa, mas ambas estas estimativas colocam as origens deste grupo após a abertura da passagem de Drake e o estabelecimento das camadas de gelo permanentes na Antártida, indicando que a evolução das AFGPs devem ter sido impulsionada por mudanças climáticas no limite Oligoceno-Mioceno ou transição climática Mioceno médio (Rogers, 2007; Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Contudo, em estudo publicado neste ano na revista PLOS One por Matschiner, Hanel, Salzburger (2011), os pesquisadores utilizando-se também de uma filogenia calibrada através do registro fóssil, estimaram a data surgimento da AFGP e da radiação nototenióides, mas lançando mão de vários processos de validação cruzada e avaliação da confiabilidade das as restrições empregadas. Os resultados levaram os autores a concluir que radiação adaptativa começou perto a transição Oligoceno-Mioceno, coincidindo com a crescente presença de gelo no oceano antártico. Essas estimativas das datas de divergência dos nototenióides estão de acordo com a hipótese de que a evolução da AFGP foi o elemento desencadeador chave deste processo de radiação adaptativa, sendo também congruentes como os tempos estimados para que a especiação deste grupo tenha se dado por vicariância e a partir da separação de Gonduana (Matschiner, Hanel Salzburger, 2011)..
As datas de divergência dos nototenióides com base em seis pontos de calibração por fósseis diferentes identificam que a radiação do táxon antártico começou perto a transição Oligoceno-Mioceno entre 16,7 e 31,9 milhões de anos, tendo sido rapidamente seguido por uma diversificação subseqüente dentro deste subgrupo dos nototenióides dos ocorrido entre 15,3 e 28,2 milhões de anos atrás. Estas estimativas, portanto, estão em acordo com as estimativas anteriores (24,1 ± 0,5 Ma), com base no suposto fóssil de eleginopídio da espécie P. Grandeastmanorum (Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Após a evolução inicial do primeiro gene da AFGPs, duplicações sucessivas deste gene acabaram por dar origem a uma grande família multigênica constituída pela 8 isoformas conhecidas hoje que possivelmente evoluíram em resposta à exigência de maiores quantidades de AFGP nos líquidos corporais e tecidos destes peixes, podendo compensar a diminuição geral das taxas da expressão gênica e síntese de proteínas que ocorrem em baixas temperaturas e por causa da baixa taxa metabólica (Cheng, 1998).
Desta maneira a origem do gene da AFGPs poderia ter ocorrido de forma gradativa, começando pela replicação por deslizamento de acidental em um intron do gene ancestral do tripsinogênio, com duplicações subseqüentes dos segmentos que codificam o motivo glicotripeptídico Thr-Ala-Ala conferindo em alguma medida evitação do congelamento sem perda imediata da atividade de tripsina (Cheng, 1998, Matschiner, Hanel Salzburger, 2011).
Conclusão:
A beleza desse processo não deve ser subestimada, muito menos o fato de podermos desvendá-lo a partir de estudos genômicos comparativos, filogenéticos, fisiológicos e geológicos. Como já comentado, ao sobrepor os dados filogenéticos que mostram a relação de parentesco dos peixes desta subordem (e da família Channichthyidae) às informações referentes as alterações climáticas e geológicas, isso nos permite observar que o padrão de derivação destas várias características não foi
abrupto, em um passe de mágica, mas ocorreu de forma gradativa em diversas etapas, com a origem das AFGP e das adaptações moleculares da tubulina ocorrendo primeiro ,junto a origem da subordem, assim como as reduções de hematócrito, cerca de 25 milhões de anos atrás. Seguidas pela perda da hemoglobina na família Channichthyidae, ocorrendo a cerca de 8 milhões de anos, e ainda posteriormente, as perdas independentes da mioglobina cardíaca ocorrendo em alguns ramos desta família (Carroll, 2006).
O padrão de evolução dos nototenióides e os fatores desencadeantes e possibilitadores, segundo vários cientistas (veja Rogers, 2007 por exemplo), provavelmente, podem ter sido similares aos que estão por trás da evolução de vários grupos de outros organismos na Antártida, especialmente invertebrados. Tendo ocorrido também em resposta a nichos vagos, além de também ter envolvido adaptações específicas para a vida em baixas temperaturas. Assim, a partir de exemplos particulares, conseguimos avançar na compreensão dos padrões gerais da macroevolução e descortinar mecanismos, princípios e processos de grande abrangência e alto poder explicativo.
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Referencia:
Carroll, S.B (2006) The Making of the Fittest: DNA and the Ultimate Forensic Record of Evolution 2006, W. W. Norton & Company; 288 pgs. ISBN 0393061639.
Referências adicionais:
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Chen L, DeVries AL, Cheng CH. Evolution of antifreeze glycoprotein gene from a trypsinogen gene in Antarctic notothenioid fish. Proc Natl Acad Sci U S A. 1997 Apr 15;94(8):3811-6. PubMed PMID: 9108060; PubMed Central PMCID: PMC20523.
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Créditos das figuras.
PDB
E os créditos das demais figuras estão nas próprias figuras.
A seqüência primária das β-tubulinas da classe II nas espécies de nototenióides estudados contém substituições singulares de
resíduos de aminoácidos que aumentam a hidrofobicidade e da
flexibilidade das cadeias polipeptídicas, dois fatores favorecem a
formação de microtúbulos em ambientes pobres em energia.
Alterações similares também foram descritas nas cadeias
polipeptídicas de outras α- e β-tubulina destas espécies. Além
disso, outro desafio a expressão e bom funcionamento dos
microtúbulos em condições semelhantes as que vivem os peixes
antárticos relacionam-se a síntese de quantidades suficientes de
α- β- tubulinas de maneira que atinjam as concentrações
críticas celulares de dímeros de tubulina.
Entre essas adaptações poderíamos incluir o aumento no número de genes para α- β- tubulina, além da própria organização destes
genes em unidades mais eficientemente transcritas, a evolução de
elementos promotores, reforçadores, RNAs polimerases e fatores de
transcrição e de sistemas de estabilização mRNA também mais
eficientes. De fato várias evidencias nos levam a crer que foi
exatamente isso que aconteceu. Os exons, íntrons e regiões não
traduzidas de genes de α-tubulina são notavelmente similares entre
si em termos das seqüências; e as regiões intergênicas entre os
genes α- e β- são significativamente palindrômicas, sugerindo que
este grupo de genes intimamente relacionados deve ter acontecido por
duplicação, inversão e divergência de um gene comum α-tubulina
ancestral. Portanto, em função dessa e de outras observações os
cientistas propuseram que a adaptação ao frio do sistema de
microtúbulos de peixes antárticos se deu, pelo menos em parte,
através da expansão das famílias de genes para α- β-
tubulinas que ajudaram a garantir a síntese eficiente desses
polipeptídeos.