A origem de nova informação genética. Parte II
Em post anterior comentei sobre alguns dos mecanismos responsáveis pela introdução de nova “informação genética” nos genomas dos seres vivos, através da criação de novos genes. Na figura abaixo está ilustrado um caminho potencial para o surgimento e diversificação estrutural e funcional de um novo gene, que envolve quatro dos processos discutidos anteriormente: (i) duplicação gênica, (ii) retro-tranposição (através da ação da transcriptase reversa de um retroposon) de um RNA mensageiro codificado por um segundo locus; (iii) embaralhamento exônico (exon shuffling); seguido de (iv) fusão gênica, culminando com a formação de uma novo gene que codifica para uma proteína quimérica.

Chamemos de gene A, o gene duplicado. Após a duplicação, que pode ser provocada por um crossing over desigual, uma das cópias pode sofrer mutações e se transformar em um pseudogene, sendo perdida ao longo do tempo. Pseudogenes, entretanto, podem funcionar como fósseis moleculares e nos ajudar a recriar as etapas de formação de um novo gene. Porém, o ponto importante, é que a função estará protegida, já que existe uma cópia extra. Esta cópia extra pode, por sua vez, pode sofrer uma inserção de um novo segmento de DNA. Neste caso, este segmento é resultado da transcrição reversa (intermediada por um retrotransposon, como o L1, que sintetiza um DNA a partir do transcrito de RNA) de um outro gene, que chamaremos de gene B. Como este transcrito já foi processado e teve seus introns removidos, isto se refletirá no DNA resultante, que possuirá um único grande éxon originado a partir do RNA já processado. Estas "marcas" continuarão no gene novo e, assm, ao compararmos este novo gene com seqüências homólogas, poderemos recriar sua história a partir destes detalhes.
Ao se inserir no genoma, no meio da cópia do gene A, esta sequência de DNA poderá acrescentar um códon de parada precoce, interrompendo parcialmente a cópia do gene A. Assim todo os segmentos posteriores a einserção, no sentido da transcrição pela RNA polimerase, serão perdidos. Assim esta porção se degenerará, em um processo semelhante a “pseugenisação”. Caso este novo gene não tenha se originado há muito tempo, poderemos identificar esta região que seria muito semelhante em seqüência, a região homóloga, do gene A original.
O novo gene produziria uma proteína quimérica, formada a partir da junção de partes dos exons do gene A com o grande éxon resultado do processamento e remoção dos introns do transcrito do gene B. Como cada éxon pode codificar um domínio petídico semi-autônomo, problemas de enovelamento poderiam ser corrigidos posteriormente com mutações compensatórias que estabilizariam termodinamicamente a proteína. Uma função inteiramente nova poderia surgir já que os diferentes domínios combinados poderiam agir sinergisticamente. Como abordado em outro artigo, este processo poderia ser ainda mais facilitado pela redução da população efetiva, o que tornaria a seleção purificadora menos eficaz, aumentando o número de mutações toleráveis. Mesmo problemas de enovelamento que pudessem ter um impacto mais drástico (induzindo doenças degenerativas ligadas a formação de muitas folhas beta, um tipo de estrutura secundária) através da formação de agregados protéicos, como os associados ao mal de Alzheimer, poderiam ser tolerados caso este processo atingisse seu estado crítico apenas após a idade fértil e o auge do período reprodutivo, como ocorre com o próprio mal de Alzheimer e a doença de Parkinson, etc.
Em um primeiro olhar, todo este modelo pode parecer um pouco forçado, mas certamente é um caminho possível, corroborado por estudos comparativos e pela genética evolutiva de populações moderna, que respalda esta possibilidade. Porém, o mais curioso, é que esta especulação, na realidade, não é uma especulação, mas a descrição da origem do gene Jingwei, a partir da duplicação do gene Yellow-empire e da fusão de uma das cópias, o gene Yande (funcional em outras espécies), com um transcrito reverso do gene Adh, em moscas do gênero Drosophila. Uma ótima descrição do processo pode ser encontrado aqui.
Tudo isso foi possível graças a possibilidade de comparação entre genes homólogos, e das regiões a eles adjacentes, que permitiram re-construir, e desvendar, os processos que deram origem a este novo gene.
O acúmulo de dados genômicos, associado a invetividade dos cientistas (amparados por novos algoritmos, aumento da capacidade computacional, além de novos procedimentos experimentais), nos trará ainda mais surpresas e detalhes sobre a evolução de novos genes e genomas.
Referências:
Wang W, Zhang J, Alvarez C, Llopart A, Long M. The origin of the Jingwei gene and the complex modular structure of its parental gene, yellow emperor, in Drosophila melanogaster. Mol Biol Evol. 2000 Sep;17(9):1294-301. PubMed PMID: 10958846.
Chandrasekaran , C. & Betrán , E. (2008) Origins of new genes and pseudogenes . Nature Education 1(1)
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Ambos esquemas, descrevendo a origem dos genes e o alinhamento como os genes "parentais", foram criados por mim. Usem (modifiquem), mas creditem e não impliquem que concordo com vcs sem me consultar.