Em um lago de hormônios
Homólogos da ocitocina desempenham funções semelhantes no comportamento social de peixes.

É bem conhecido que o peptídeo oxitocina, e os seus homólogos em vertebrados não-mamíferos, desempenham um papel neuroendócrino crucial ao modular uma gama ampla de comportamentos sociais [1]. Mais recentemente foi proposto que esta classe de hormônios teria como uma de suas principais funções o direcionamento da atenção dos indivíduos a estímulos que fossem socialmente relevantes, aumentando a motivação e guiando a tomada de decisão durante estas interações sociais [2].
Estas ideias lançam luz sobre algumas das questões mais relevantes para compreendermos a evolução dos comportamentos sociais, nos permitindo entender por que, enquanto, algumas espécies vivem em complexos contextos de interação social, outras vivem sós e com mínima interação entre os coespecíficos.
Agora um novo estudo publicado no periódico Animal Behaviour realizado por pesquisadores da Universidade Macmaster do Canadá amplia nossa compreensão sobre estas questões ao analisar o papel destes hormônios em peixes, mais especificamente no ciclídeo, Neolamprologus pulcher, uma espécie encontrada no lago Tanganyika na África que exibe um comportamento altamente social, diferente de muitos de seus parentes [2].
Como explica Adam Reddon, o primerio autor do estudo, pós-doutorando do Departamento de Psicologia, Neurociência e Comportamento, da Universidade McMaster:
“Nós sabemos como esse hormônio afeta os seres humanos” “Ele está relacionado ao amor, a monogamia, e até mesmo ao comportamento de risco, mas sabemos muito menos sobre seus efeitos sobre os peixes.”[1]
Esta espécie forma um sistema hierárquico permanente centrado em um par dominante acasalante que é ajudado por outros peixes que cuidam dos peixes mais jovens e ajudam da defesa do território. Os pesquisadores decidiram testar se um aumento na isotocina, o homólogo dos teleósteos da oxitocina, aumentaria a resposta à informação social em peixes como N. pulcher que são caracteristicamente sociais e que cooperam da criação dos jovens. Para tal intuito, o grupo de pesquisadores da Universidade Macmaster injetaram esta versão dos teleósteos da oxitocina, isotocina, em alguns dos animais enquanto outros, os pertencentes ao grupo controle, receberam uma injeção de solução salina [1, 2].
O primeiro experimento conduzido pelo grupo de biólogos envolvia uma competição simulada por território contra um único rival. Os resultados deste experimento revelaram que os peixes tratados com isotocina eram mais sensíveis as dimensões de seus opositores, independentemente de seu rival ser um outro peixe ou a sua própria imagem refletida em um espelho. Os animais tratados com o homólogo da oxitocina lutavam de acordo com o tamanho de seu oponente enquanto os animais do grupo controle que receberam a solução salina, ao invés da isotocina, lutavam de acordo com suas propensões intrínsecas de agressividade. Em um segundo experimento que envolveu um teste das habilidade do grupo social, os biólogos observaram que os animais tratados com o hormônio eram mais responsivos a comportamentos agressivas dos membros dominantes e também produziam mais demonstrações de submissão que é um tipo importante de sinal exibido pela espécie em questão [2]. Como Reddon comenta:
“O hormônio aumenta a capacidade de resposta à informação social e pode agir como uma ‘cola social’ importante", [1]
e complementa: “Ele garante que os peixes lidem bem com o conflito e mantem o grupo coeso porque eles terão conflitos mais curtos e menos onerosos.”[1]
Assim, de acordo, com o grupo de cientistas que conduziram esta pesquisa, estes experimentos com a isotocina fornecem evidências de que ela realmente aumenta a capacidade de resposta a informações sociais e, portanto, estes achados dão apoio adicional a ideia que a função desta família de hormônios nonapeptídeo (a qual pertence a oxitocina) como reguladores do comportamento social em vertebrados é também conservada [2]. A autora sẽnior do estudo, Sigal Balshine, professora assistente do Departamento de Psicologia, Neurociência e Comportamento da mesma Universidade e orientador de Reddon explica:
“Nós já sabíamos que esta classe de neuropeptídeos é antiga sendo encontrada em quase todos os grupos de vertebrados”[1]
“O que é especialmente excitante sobre estas descobertas é que elas reforçam a idéia de que a função desses hormônios, como moduladores de comportamento social, também foi conservada.” [1]
Aos poucos fica cada vez mais claro que a natureza gregária de muito vertebrados e a forma complexa como nos organizamos socialmente, que mostra-se mais salientes em alguns grupos do que em outros, como é o caso de nós mamíferos, na realidade, depende de uma base neuroendócrina compartilhada muito mais antiga e geral que vai aos poucos sendo elucidada pelos esforços da biologia evolutiva.
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Literatura Citada e Recomendada:
McMaster University [Released: 10/9/2012 9:40 AM EDT] Swimming with Hormones: Researchers Unravel Ancient Urges That Drive the Social Decisions of Fish [Link]
Reddon, Adam R., O'Connor, Constance M., Marsh-Rollo, Susan E. Balshine, Sigal. Effects of isotocin on social responses in a cooperatively breeding fish. Animal Behaviour, 2012; 84 (4): 753 DOI: 10.1016/j.anbehav.2012.07.021
Créditos das Figuras:
Fotos dos autores disponíveis e creditadas nos sites de suas instituições
Foto de Neolamprologus pulcher: autor: Guérin Nicolas (Own work) [GFDL or CC-BY-SA-3.0], via Wikimedia Commons)
Grande abraço,
Rodrigo