Mais pistas sobre as origens do membros nos vertebrados
Novas pistas sobre as alterações genética que possibilitaram a evolução dos membros nos vertebrados sugerem que um rearranjo cromossômico tenha tido um papel importante nesse processo. Os resultados são de um trabalho publicado online no periódico Nature: Scientific Reports que foi conduzido por Manuel Irimia, vários colaboradores, e o chefe do laboratório Reg-Volution Jordi Garcia-Fernández, do Departamento de Genética do Instituto de Biomedicina da Universidade de Barcelona (IBUB). O grupo vem estudando um tipo particular de gene, conhecido como Sonic Hedgehog (Shh) cujos loci encontram-se no cromossomo 7, codificando uuma das três proteína envolvida na via de sinalização hedgehog, ligando-se ao receptor Patched-1 (PTCH1) e funcionando como uma molécula morfogenética. Esta proteína desempenha uma papel fundamental na regulação da organogênese dos vertebrados, tendo uma ação bem conhecida nos processos de crescimento de dígitos nos membros e na organização do cérebro durante o seu desenvolvimento, sendo esses dois os tecidos em que é mais expresso.
Os estudos com os loci Shh foram conduzidos em três espécies de anfioxos - que são usados como referência sendo um dos grupos mais basais do filo dos cordatos e que não apresentam membros e nem nadadeiras pareadas- dos EUA, Europa e Ásia, respectivamente, Branchiostoma floridae, Branchiostoma lanceolatum e Branchiostoma belcheri. Os pesquisadores empregaram métodos de bioinformática para análise das seqüências genômicas e também métodos de transgenía com o peixes-zebra, comparando então a arquitetura ancestral genética do gene Hedgehog com a dos três representantes da família Hedgehog em vertebrados: Sonic Hedgehog (Shh), Desert Hedgehog (Dhh), e da Índia Hedgehog (Ihh), todos mebros da via de sinalização Hedgehog.
Surpreendentemente a região regulatória (o 'reforçador' ou 'enhancer') que controla a expressão do gene Shh nos membros dos vertebrados localiza-se dentro de um outro gen, Lmbr1, estando a uma distância de um milhão de pares de bases, enquanto, no caso do desenvolvimento do sistema nervoso, a distância entre o gene e sua região reguladora é consideravelmente menor, de apenas algumas dezenas de milhares de pares de bases.
Na figura à esquerda, em (A), pode ser vista a distribuição das sequências reforçadoras ('enhancers') tecido- específicas através da grande região a montante ('sequência acima') e nos introns do gene Shh no cromossomo 5 de camundongos. Cada elemento reforçador é representado como um bloco colorido e a sua expressão associado é mostrada na mesma cor nos desenhos de embriões. Os elementos SFPE1 (verde) e SFPE2 (amarelo) impulsionam a expressão ao longo da placa basal da medula espinhal; SBE1 (lilás), no mesencéfalo e e diencéfalo caudal, incluindo o ZLI; SBE2-4 (vermelho e escuro e azul claro), em domínios anteriores no cérebro em desenvolvimento; MRCS1 (roxo), MFCS4 (marrom claro) e MACS1 (castanho escuro) nas linhas epiteliais, e MFCS1/ZRS (laranja claro) para brotos dos membros. Dois elementos reforçadores estavam dentro da sequência intrõnica do gene vizinho Lmbr1 (MFCS1/ZRS) e Rnf32 (MACS1), e duas dentro do segundo intron do Shh (SBE1 e SFPE2). Em (B) pode ser visualizada a distribuição dos elementos reforçadores conhecidos no gene Shha do peixe-zebra. ar-A (verde claro), conduz a expressão na notocorda e algumas estruturas cerebrais; ar-B (laranja escuro), induz a expressão em todo na placa do assoalho da medula espinhas, ar-C (verde escuro), no prosencéfalo e na notocorda, e em menor intensidade na placa do assoalho; e ar-D (amarelo), na placa do assoalho anterior. [Scientific Reports 2, N0. 433 doi:10.1038/srep00433]
Assim, de acordo com Garcia-Fernández, por volta de 400 milhões de anos atrás, como resultado de um rearranjo cromossômico (uma translocação gẽnica), um fragmento de DNA com o gene Lmrb acabou indo parar perto do gene Shh e passou a induzir sua expressão em outro tecido, fazendo desta forma que uma nova função e novas estruturas surgissem nos vertebrados.
O estudo também traz novas informações para o debate científico sobre a hipótese de 2R que estipula que a origem do genoma dos vertebrados teria se dado por meio de duas rodadas completas de duplicações genômicas ancestrais consecutivas. De acordo com o artigo, os genes Shh e Dhh teriam se originado na segunda rodada de duplicação do genoma, enquanto Ihh gene, que, por sua vez, não é influenciado pela região regulatória do gene Lmbr1, seria de fato uma cópia mais antiga do ponto de vista filogenético.
Aos poucos vamos aprendendo como, através dos processos de cópia, rearranjo, divergência e mudança funcional, as diversas estruturas e sistemas dos seres vivos foram se originando ao longo da história evolutiva dos diversos grupos, mostrando o poder da abordagem comparativa e da biologia evolutiva como um todo.
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Referências:
Irimia, Manuel et al., Comparative genomics of the Hedgehog loci in chordates and the origins of Shh regulatory novelties. Scientific Reports, 2012; 2 DOI: 10.1038/srep00433
Créditos das Figuras:
CLAUDE NURIDSANY & MARIE PERENNOU/SCIENCE PHOTO LIBRARY
STEVE GSCHMEISSNER/SCIENCE PHOTO LIBRARY
STEVE GSCHMEISSNER/SCIENCE PHOTO LIBRARY