Mitos sobre a evolução: "Mutações só podem destruir informação"

Este artigo traduzido que segue faz parte da série de artigos intitulada “Evolução: 24 mitos e equívocos”[“Evolution: 24 myths and misconceptions”], publicados no site da revista de divulgação científica New Scientist e escritos por Michael Le Page em 2008.
Mitos sobre a evolução: Mutações só podem destruir informação
Autor: Por Michael Le Page, publicado em 16 de abril de 2008, às 18:00
Fonte: New Scientist:
Biólogos estão revelando milhares de exemplos de como mutações conduzem a novas características e mesmo a novas espécies. Esta alegação não apenas se choca com as evidências, como é uma impossibilidade lógica.
A maioria das pessoas perde a capacidade de digerir o leite quando chega a sua adolescência. Alguns milhares de anos atrás, entretanto, após a domesticação do gado, vários grupos de pessoas na Europa e África, independentemente, adquiriram mutações que lhes permitiam continuar a digerir leite na idade adulta. Estudos genéticos mostram que têm havido seleção muito forte para estas mutações, então elas foram claramente muito benéficas.
A maioria dos biólogos veriam isso como ganho de informação: uma mudança no ambiente (a disponibilidade de leite de vaca como alimento) é refletida em uma mutação genética que permite às pessoas explorarem essa mudança (ao ganhar a habilidade de digerir o leite quando adultos). Os criacionistas, no entanto, desconsideram isso como se fosse apenas um mal funcionamento, como perda na habilidade de desligar a produção da enzima digestiva do leite após a infância.
Ao invés de nos atolarmos tentando definir o que é informação, vamos olhar para algumas descobertas feitas por outros biólogos nos últimos anos. Por exemplo, tem sido mostrado que uma simples mudança na atividade gênica em ascídias pode transformar o seu coração de uma única câmara em um com duas câmaras funcionais. Certamente isso conta como aumento da informação?
TRIMando o genoma
Alguns macacos têm uma mutação em uma proteína chamada TRIM5 que resulta em um pedaço de uma outra proteína defunta, sendo inserida na TRIM5. O resultado é uma proteína híbrida chamada TRIM5-CypA que pode proteger as células da infecção por retrovírus como o HIV. Aqui, uma única mutação resultou em uma nova proteína com uma função nova e potencialmente vital. Nova proteína, nova função, nova informação.
Apesar de um evento como esse poder parecer altamente improvável, acabou se mostrar que a proteína TRIM5-CypA evoluiu independentemente em dois grupos separados de macacos. Em geral a evolução de novos genes envolve muitas mais mutações. A forma mais comum de um novo gene evoluir é quando um gene já existente é duplicado. Uma vez que existem duas ou mais cópias, cada uma delas pode evoluir em direções distintas.
A duplicação de genes, ou mesmo de genomas inteiros, revelou-se ubíqua. Sem a duplicação de todo o genoma do ancestral das levedura modernas da cerveja, por exemplo, não haveria vinho ou cerveja. Está se tornando claro que cada um de nós tem cópias extras de alguns genes, um fenômeno chamado variação do número de cópias.
A evolução de planos corporais mais complexos parece ter sido, pelo menos em parte, resultado da duplicação dos genes Hox que desempenham um papel fundamental no desenvolvimento embrionário. Biólogos estão lentamente descobrindo como sucessivas mutações em um par de genes protoHox, em um ancestral comum das águas-vivas e anêmonas, resultou nos 39 genes Hox dos animais mais complexos.
Recém-formados
Podem as mutações realmente levar à evolução de novas espécies?
Sim. Várias espécies do marisco abalone evoluíram devido a mutações em uma proteína “chave” na superfície do esperma que se liga a um “fechadura” na superfície dos ovos. Isso pode parecer impossível, mas acontece que alguns ovos estão preparados para serem penetrados por espermatozoides desviantes. A mesma coisa pode acontecer em moscas de fruta, e provavelmente em muitos outros grupos também. Em leveduras, as mutações que levaram à formação de algumas espécies novas foram não só identificadas, como foram até mesmo revertidas.
A lista de exemplos poderia continuar indo e indo, mas pense nisso. A maioria das mutações podem ser revertidas por mutações subsequentes – uma base do DNA pode ser transformada de A para G e de volta para A, por exemplo. De fato, mutações reversas ou “reversões” são comuns. Para cada mutação que resulta na perda de informação, logicamente, a mutação reversa deve resultar em seu ganho. Então, a alegação de que mutações só destroem a informação, não podendo criá-la, não só desafia as evidências, como desafia a própria lógica.
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Traduzido por Rodrigo Véras
Créditos das figuras: