Olhos em tubos de ensaio e auto-organização de vesículas ópticas
Uma dos mais fascinantes enigmas do processo de desenvolvimento é como as instruções lineares do genoma podem dar origem a um organismo multicelular completo em três dimensões. Este enigma tem implicações bastante amplas, algumas delas muito práticas como a descoberta da 'receita' para produção de órgãos in vitro para transplantes (o santo graal da medicina regenerativa), bem como outras bastante profundas e diretamente relevantes para a compreensão dos mistérios que envolvem a evolução dos seres multicelulares.
Talvez parte desse enigma em solucionar este enigma, como muitos têm apontado ao longo do último século, esteja na linguagem que adotamos para descrever as relações entre os genótipos dos organismos e seu desenvolvimento ao longo de sua ontogenia, ou seja, do seu ciclo de vida a partir de um óvulo fertilizado até a morte. Eu mesmo intencionalmente descrevi esta relação como iinstrucional, dando a entender que um simples código linear daria origem de forma direta a um complexo sistema em três dimensões. Mas sabemos, há muito tempo, que isso é uma simplificação grosseira, ainda que em muitas circunstâncias seja absolutamente útil tratar certos sistemas desta maneira, como uma abordagem inicial.
Sabemos muito sobre como os genes são ligados e desligados durante o desenvolvimento e quais os tipos de proteínas são por eles codificadas e temos razoável certa ideia de como elas interagem entre si, mas estamos ainda apenas começando a ter uma compreensão mais ampla dos princípios mais gerais que governam os resultados globais dessas interações locais e como esses resultados retroalimentam e interferem nessas mesmas interações entre as partes, produzindo efeitos de longa distância e que se alteram ao longo do tempo.
Desde o começo da ontogenia, os organismos são complexos sistemas dinâmicos adaptativos. Então, apesar de muitas de suas propriedades serem decorrentes da pré-estruturação da célula ovo (o que inclui o seu genoma, mas não somente ele) e do ambiente circundante, seja ele um útero ou um ovo, em vários outros espectos das propriedades do sistema em desenvolvimento parecem emergir, aos poucos, derivadas das dinâmicas de interações que ocorrem neste sistema em função, não só de sua composição, mas das propriedades físicas e geométricas globais que vão 'epigenicamente' e progressivamente se constituindo, uma após da outra, por causa das interações que ocorreram antes ao longo do desenvolvimento.
Esta forma de encarar o processo de desenvolvimento já é implicitamente aceita desde o fim das disputas entre 'pré-formacionista' e 'epigenesistas' (defensores da epigênese), mas, na prática, acabou sendo obscurecida pela descoberta do papel do DNA na hereditariedade, especialmente no desenvolvimento ontogenético, o que abriu o caminho para o sucesso das metáforas de 'código', 'programa' e 'planta' - frequentemente empregadas para descrever as relações entre genótipo e fenótipo, ou seja, o mapa genótipo-fenótipo - e que reforçam o estereótipo da relação simples entre o genoma e o desenvolvimento ontogenético.
Darcy W.. Thompson foi provavelmente o primeiro (em tempos mais modernos) a ressaltar que estruturas biológicas obedecem a leis físicas e que por causa disso, portanto, muitos aspectos da forma biológica originam-se como uma simples consequência da interação entre forças mecânicas externas e internas, atuando ao nível das células, tecidos e órgãos durante o desenvolvimento ontogenético [Veja o artigo "É a evolução genética previsível? Parte II ou Além da genética parte I"]. Thompson também mostrou através de esquemas simples que diferenças no crescimento relativo de partes diferentes de uma estrutura biológica poderiam levar à mudanças na forma da estrutura observada durante a ontogenia do organismo, fazendo com que ele se assemelhasse a outro de outra espécie, contribuindo desta maneira para nossa compreensão de como as diferenças entre espécies e linhagens específicas em sua morfologia poderiam ter surgido a partir de mudanças nos sistemas que controlam os padrões relativos de crescimento dos sistemas, tecidos, órgãos e estruturas biológicas.
Mais tarde o trabalho seminal de Turing abriu novas perspectivas ao mostrar como um padrão organizado e dinamicamente cambiante poderia emergir em um sistema inicialmente homogêneo a partir de pequenas perturbações aleatórias [1,2].
O sistema de 'reação-difusão de Turing' [Veja os artigos "É a evolução genética previsível? Parte II ou Além da genética parte I" e "Viva Turing ou como os camundongos conseguem seu palato enrugado."] e o modelo de 'Informação posicional', proposto pelo Biólogo do Desenvolvimento Lewis Wolpert, foram cruciais em uma época, antes do advento da moderna genética molecular, proporcionando algumas avenidas de pesquisa em um campo cuja busca pelas bases químicas dos mecanismos de indução embrionária mostrara-se mal sucedida. Porém, a explosão posterior da genética molecular, como as técnicas de DNA recombinante e isolamento e caracterização de genes e circuitos gênicos e de seus produtos, acabou por erodir este interesse em modelos de 'originação da forma biológica', deslocando o foco para o estudo das bases genéticas e bioquímica desse processo, e longe do estudo dos mecanismos formadores de padrão.
Os biólogos tornaram-se cada vez mais interessados em decifrar os padrões espaciais e temporais de expressão dos genes e compará-los entre as espécies modelos. Por isso, a questão da origem ontogenética da forma biológica ficou em segundo plano como se fosse obviamente uma decorrência simples e direta dos genes associados ao desenvolvimento. Apesar deste desvio de foco, muitos cientistas de formação física e matemática continuaram a perseguir as intuições de Thompson e Turing, investigando modelos de desenvolvimento bastante elegantes e refinados. Contudo, a maioria destes pesquisadores, mais interessados nos mais concentrados em reproduzir a dinâmica dos processos de morfo e organogênese, infelizmente, poucas vezes incorporavam detalhes moleculares e genéticos conhecidos dos sistemas de desenvolvimento que buscavam modelar. De maneira equivalente, os geneticistas moleculares continuavam com seu interesse muito focado na expressão de genes, muitas vezes ignorando o impacto das mudanças dinâmicas na geometria e nas propriedades e forças físicas dos tecidos nos padrões espaciais e temporais de expressão dos genes e das alterações
Essa cisão entre os dos campos foi ainda acentuada por que muitos dos modelos matemáticos iniciais simplesmente não anteciparam a característica 'falta de elegância' dos sistemas reais que destinavam-se a representar, muito mais contingentes e complicados do que as simples e belas propostas dos teóricos. Mais uma vez víamos belos e elegantes modelos serem dilacerados pelos 'horríveis' fatos biológicos [2,3].
Ainda assim, as contribuições conjuntas de Thompson, Turing, Wolpert, e de seus sucessores, oferecem um ponto de vista que não pode ser menosprezado. Esta perspectiva encara a forma biológica não como algo especificado por um programa genético detalhado, uma planta, ou mesmo uma receita, mas como resultado de propriedades emergentes envolvendo processos relativamente simples que ocorrem em contextos físicos e químicos particulares. Portanto, é neste contexto que as descobertas sobre os detalhes moleculares e genéticos devem compreendidas, sendo a divisão entre as duas abordagens ao estudo da forma biológica contraproducentes, devendo ser complementares e integradas. A admissão por parte dos teóricos que os genes desempenham um papel crucial no processo, e que desta maneira devem ser incorporados explicitamente nos modelos teóricos de formação de padrões, é um passo importante, uma vez que, apesar das similaridades, existem diferenças nos padrões formados em contextos biológicos dos envolvendo apenas a química e a física. Os padrões biológicos possuem tanto uma história ontogenética como evolutiva, além de serem eles próprios diversificados, algo que precisa também ser explicado pois a variação é uma parte essencial dos ciclos de vida individuais e da evolução [3].
Os modelos mais modernos são muito mais biologicamente embasados, incorporando o máximo de informação molecular possível sem que os tornem matematicamente ou computacionalmente intratáveis, dependendo de um constante diálogo com experimentadores. Isso nos tem permitido aproximarmos melhor dos sistemas biológicos reais e da complicada mistura de regras dinâmicas, leis físicas e contingência histórica e flutuações ao acaso que caracterizam estes sistemas. Outro fator que impulsionou o interesse em modelagem mais abstrata de sistemas biológicos resultou provavelmente da incrível quantidade de dados oriundos dos programas de sequênciamento de genomas de vários organismos, dando origem a febres das "ômicas", como projetos subsequentes de análise em massa de transcritos e dos produtos protéicos (transcriptômica e proteômica) e seus padrões de expressão diferencial (genômica, transcriptômica e proteômica funcionais) que, por sua, dependem enormente da área de bioinformática que passou a se beneficiar muito dos estudos sobre redes, permitindo a incorporação da descrição e estudos das redes de genes, proteínas e metabólitosm, suas propriedades e seus padrões de interação, através de inciativas apelidadas de i'interatômica' e 'metabolômica' [4].
A organogênese e a morfogênese são alguns desses processos que devem ser investigados de maneira mais ampla, uma vez que depende da orquestração de muitas interações celulares, as quais fazem emergir os comportamentos coletivos das células e tecidos necessários para formar tecidos em desenvolvimento. É ainda pouco claro como partes localizadas do indivíduo em desenvolvimento são capazes de coordenar umas com as outras de modo darem origem aos órgãos inteiros. Porém, estudar tais processos não é uma tarefa fácil. Um dos pontos cruciais é que os genes agem de maneira indireta e , portanto, contexto dependente, fazendo seu trabalho ao alterar parâmetros que influenciam os comportamentos celulares (divisão simétrica ou assimétrica, taxa de proliferação e apoptose, expressão de receptores para fatores difusíveis e moléculas de adesão que interagem com as de outras células e migração, mudanças no cito-esqueleto etc) e as propriedades dos tecidos em que elas estão deformados em alguns pontos e os enrijecendo em outros, por exemplo, e os fazendo responder de maneira distinta a diferentes estímulos [Veja também "É a evolução genética previsível? Parte II ou Além da genética parte I"].
Contudo, mais recentemente, a combinação de técnicas de imageamento ao vivo, protocolos de interdição e dissecação molecular, análise biofísica e modelagem computacional estão nos oferecendo novos vislumbres desse processo e, assim, uma melhor compreensão dos principais processos biomecânicos subjacentes que mostram com as células produzem as forças e como essas forças locais são integradas em grandes folhas de células, nos permitindo compreender melhor como a morfogênese depende do contexto geométrico e biomecânico [4,5].
No entanto, pode se ir mais longe, uma vez que existem abordagens que parecem capturar de maneira mais completa os princípios de organização em que eles se assentam, principalmente o que alguns chamam de ‘formadores de padrão’, como os baseados nos modelos de reação-difusão de Turing e, os mais difundidos, de informação posicional que dependem da interação de gradientes químicos e de limares de ativação. Esses processos geralmente funcionam por causa de interações não-lineares entre os componentes especialmente a partir de laços de alimentação positiva ou negativa e de outros tipos de interações não-lineares que permitem a auto-organização de sistemas químicos, físicos e biológicos. [Ver Njhout]. O que chamamos de auto-organização é a formação espontânea de estruturas espaciais, temporais, ou espaço-temporais ou de funções em sistemas compostos de poucos ou muitos componentes. Este tipo de fenômeno de auto-organização na física, química e biologia ocorre em sistemas abertos que se mantém afastados do equilíbrio térmico [1] e como coloca Cosma Shalizi tal fenômeno pode ser altamente contra-intuitivo:
“Algo está se auto-organizando caso, deixado por si só, tende a se tornar mais organizado. Esta é uma propriedade incomum, na verdade bastante contra-intuitiva: esperamos que, deixados por si mesmos, as coisas fiquem confusas, e então quando nos deparamos com um grau muito elevado de ordem, ou um aumento na ordem, algo, alguém, ou pelo menos alguma coisa peculiar, é a responsável. (Este é o coração do Argumento do Design.) Mas agora sabemos de muitos casos em que essa expectativa é simplesmente errada, em que coisas podem começar em um estado altamente aleatório e, sem serem moldadas a partir do exterior, tornarem-se cada vez mais organizadas .”
Entre os processos de auto-organização envolvem mecanismos de 'formação de padrões' pelos quais estruturas ordenadas surgem dentro de um sistema inicialmente homogêneo ou, pelo menos, não-estruturado, sendo a compreensão desses mecanismos e processos absolutamente fundamentais para a compreensão de como funciona o desenvolvimento ontogenético e como ele é mudado durante a evolução. Como H. F. Nijhout enfatiza:
“Na prática, a formação de padrões refere-se a coisas como os processos em embriões que determinam onde a gastrulação irá ocorrer, ou os processos que definem onde os ossos vão condensar no mesênquima de um membro em desenvolvimento, quantos haverão, sua forma e a suas posições em relação aos outros. Ou em plantas,, onde as folhas irão formar-se na haste de uma planta, e que forma as folhas terão.” [3]
Porém, uma das dificuldades para investigar essa complexa dinâmica de interação é achar um meio termo entre a simplificação exagerada do sistema modelo (por exemplo, que vem de estudá-lo em partes muito pequenas e simples, perdendo boa parte do contexto) e o excesso de informação e de variáveis que complicam qualquer tratamento que pode vir de estudar o sistema completo. Alguns desses processos, entretanto, parecem ser altamente ubíquos e realizáveis por muitos sistemas moleculares diferentes podendo ser considerados 'genéricos' (como já discutido em artigo anterior) aparecendo em vários organismos diferentes e na formação de vários tecidos de um mesmo organismo.
Esses processos apresentam-se como oportunidades para os pesquisadores já que podem tanto revelar características gerais como detalhes específicos de cada sistema. Como afirmam os pesquisadores Ray Keller e David Shook [4], do Depto de Biologia da Universidade da Virginia, em uma comentário no BMC Biology, o dobramento de camadas laminares de célula é um destes processos ativos tremendamente importantes durante a morfogênese normal ocorrendo durante a embriogênese de organismos multicelulares, o que inclui a formação dos folhetos germinativos durante gastrulação, a formação do intestino, os divertículos do intestino, o próprio tubo neural, além da geração do sistema ótico de maneira geral, especialmente dos olhos. Nas últimas décadas de pesquisa vários mecanismos têm sido propostos e avaliados para explicar este processo de dobramento, cada um deles com vários níveis de suporte empírico. Entre eles podemos citar, a pressão de crescimento, alterações na forma das células impulsionadas por interações entre moléculas de adesão célula-célula ou célula-matriz, além de mudanças no cito-esqueleto.
O cientista Yoshiki Sasai, Yoshiki Sasai do Centro Riken de Biologia do Desenvolvimento, no Japão, é um desses pesquisadores que, há mais de duas décadas, tem buscado aperfeiçoar uma receita para um meio de cultura em que células-tronco embrionárias possam formar órgãos, sem ingredientes adicionais. Sasai e seus colegas foram capazes de desenvolver um sistema tridimensional de cultura de células em que aglomerados flutuantes de células tronco embrionárias de camundongos podem organizar-se com sucesso em uma estrutura em camadas em uma estrutura de embalagem em forma de bolsa, conhecida como “taça óptica”, muito semelhante a que se desenvolve nas camadas interior e exterior da retina durante a embriogênese [2].
Sasai e seus colegas puderam observar que, como esperado para a maioria das células embrionárias, os agregados de células-tronco formaram inicialmente esferas ocas, mas após um período de sete perceberam pequenas estruturas ‘brotando’ para fora dos limites exteriores das esferas, e o mais interessante essas ‘bolsas’ estavam tinham a coloração verde brilhante oriunda de marcador que indica a diferenciação retiniana [3]. Com a continuação das observações dos agregados em cultura, os biólogos, notaram que cada uma dessas pequenos brotos dobraram-se sobre si mesmos, organizando-se na forma de uma taça com duas camadas de células. Assim, as células tronco embrionárias, derivadas do epitélio retinal, espontaneamente formaram vesículas hemisféricas epiteliais que se exibiam padrões ao longo de seu eixo proximal-distal, em que a porção proximal diferenciou-se em epitélio pigmentar mecanicamente rígido, enquanto a porção distal flexível progressivamente dobrou-se para dentro [2]. Ao lado, podemos ver vesículas ópticas, formadas por células tronco embrionárias cultivadas ao longo de nove dias em um meio de cultura especial livre de soro especial para agregados similares a corpos embrióides - originalmente desenvolvido para cultura de camadas de células corticais, mas modificado para o cultivo das taças óticas - que passaram por invaginação, com a cor verde fluorescente indica expressão retina específica dos produtos do gene Rax nas taças óticas.
As semelhanças eram inegáveis, essas estruturas eram taças ópticas embrionárias, a estrutura precursora de uma retina totalmente diferenciada, e estavam formando, sem qualquer intervenção direta no meio de cultura desenvolvido pelo time de cientistas japoneses. Além disso essas células também exibiram migração nuclear intercinetica e a foram capazes de produzir tecido neural estratificado da retina, como ocorre com o animal inteiro [2].

Como afirmou o biólogo Bruce Conklin do Instituto Gladstone de Doenças Cardiovasculares em San Francisco:
"Eles capturaram vários tipos de células se auto-organizando e realmente originando uma forma que era reconhecível a qualquer um como um taça óptica" [3]
E que completou:
"Agora, se você pode capturar isso, você pode começar a desmontá-lo e ver o que faz acontecer." [3]
Este estudo nos traz também alguns insights sobre a evolução destes complexos sistemas genético desenvolvimentais, apontando para a natureza modular de alguns deles. Por exemplo, o fato de células-tronco embrionárias derivadas de vesículas neuroepiteliais poderem dar origem a taça ópticas, mimetizando o que ocorre nos embriões de camundongos, de uma maneira auto-organizada, em cultura celular, sem precisar interagir com outros tecidos deixa isso claro [5].

A figura acima mostram diagramas seccionais ilustrando o dobramento do epitélio retinal neural em uma vesícula óptica em cultura de células-tronco derivadas de mamíferos, onde RPE = epitélio pigmentar da retina; NR = retina neural; p-MLC = cadeia leve miosina fosforilada.
Os pesquisadores empregando imagens a vivo multifotônicas revelaram quatro fases nesse processo:
Uma protuberância hemisférico de colunar, de células epiteliais formando uma monocamada, se estende a partir da vesícula neuroepitelial. Esta protuberância contendo níveis elevados de da proteína miosina de cadeia leve fosforilada (pMLC), apresenta-se enrijecida quando comparada a outras partes do tecido, o que é mostrado através da técnica de microscopia de força atômica (AFM) que é capaz de medir a força nos tecidos.
A parte distal da protuberância, equivalente a retina neural em diferenciação, apresenta-se com seus níveis de pMLC diminuídos e a flexibilidade aumentada, tornando-se desta maneira achatada.
A margem da região achatada da epitélio retinal mostra níveis apicais de pMLC elevados, elevada rigidez, constrição apical e “encunhamento” das células, que dobram o epitélio interna menos rígido da retina.
Por fim, pode ser observado o crescimento do epitélio flexível da retina, e sua expansão tangencial contra a porção rígida, que restringe o epitélio retinal pigmentado, acaba resultando em seu dobramento para dentro, sendo tudo muito parecido a formação de cálice óptico.
As três primeiras fases requerem a expressão das proteínas Rho quinase e actomiosina do cito-esqueleto; que não são necessárias na fase quatro, porém, sendo ainda assim, sensível a afidicolina, que inibe a síntese de DNA, e, com isso, a divisão e crescimento celular. Estas experiências novamente realçam o papel da actomiosina na regulação da rigidez do tecido e em sua contração, além do papel do encunhamento celular local enviesando os resultados subsequentes, em grande escala, das interações mecânicas entre as regiões rígidas e flexíveis, bem como o papel de crescimento em folhas célula no processo de dobramento [2, 5].
Este sistema abre, portanto, uma nova janela de investigação tanto ao possibilitar a dissecação dos circuitos gênicos e dos padrões de expressão e corregulação dos produtos desses genes, e das vias bioquímicas a qual eles fazem parte, como ao permitir o destrinchamento das forças mecânicas, da dinâmica viscoelásticas e das propriedades coletivas genéricas desses sistemas. Esta abordagem permite-nos desvendar os detalhes moleculares mais finos e ao mesmo tempo nos oferece pistas do contexto biofísico mais amplo do processo de formação de padrão.
"A lição principal em tudo isso é primeiro observarmos ver o que a natureza pode fazer por ela mesma quando são dadas instruções, essencialmente, mínimas e o meio ambiente adequado", disse Conklin [3] e completou. "E, dado o ambiente certo, as células vão entrar em ação."
Esses belos resultados, e o sistema de cultura que permitiu produzi-los, somam-se aos avanços recentes de experimentadores e teórico que estão levando a uma compreensão mais profunda de como as características geométricas e as propriedades biofísicas dos tecidos produzem as forças mecânicas que acarretam nos movimentos e deformações das células são, nos mostrando como elas reguladas e integradas em um contexto mais amplo. Como já mencionado, o fato de parte destes processos serem modulares, bem como são seus sistemas de controle genético e epigenético, ajudam a esclarecer várias características dos processos de evolução da forma biológica, especialmente nos organismos multicelulares que passam por um complexo processo de desenvolvimento, modificado ao longo das gerações por vários mecanismos evolutivos que interferem com a dinâmica dos sistemas em desenvolvimento.
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Crédito das Figuras:
BILL SANDERSON/SCIENCE PHOTO LIBRARY