Receita criacionista: Presunção e ignorância
Recentemente me deparei com um seguinte texto na sessão de perguntas do Yahoo (“É preciso muita fé para acreditar na TEORIA da evolução não acham ?”) que na realidade serve de pretexto para atacar a evolução.
Em tese o autor se propõe a trazer argumentos que, caso examinados pelo ‘Ateu’ desapaixonadamente, convenceriam-no da verdade da criação e da falsidade da evolução. Além de começar por pressupor que apenas ateus poderiam aceitar a evolução como fato e desprezar o criacionismo como uma teoria pseudocientífica (o que não é o caso, claro), o autor exibe uma incrível (mas não surpreendente) desinformação sobre biologia evolutiva e paleontologia que apenas torna evidente sua presunção. Não resisti e resolvi compartilhar com vcs aqui no tumblr bioevolutiva os [pseudo]argumentos, acrescido de comentários e correções minhas e referências e links para aprofundamento das questões levantadas.
São 11 itens e uma espécie de conclusão/consideração final que apresento aqui em destaque, seguidos dos meus comentários e de fontes adicionais. Notem o uso e abuso de falácias e estratégias como o 'quote mining’ (a 'garimpagem de citações’) e a distorção dos conceitos e evidências fornecidas pelos cientistas.
1)-Acho o Criacionismo mais coerente, porém não com a criação de 6 dias de 24 horas que muitos falam devido a uma interpretação Literal e portanto ERRÔNEA da Bíblia.
Essa primeira afirmação nem é um argumento é apenas a exposição de uma opinião pessoal e vc nem explica por que acha o criacionismo mais coerente e nem o define, já que aparentemente não é um criacionista da terra-jovem. Apenas isso pode ser concluído deste primeiro item.
2)-A alguns anos atrás, o paleontólogo britânico Colin Patterson começou a perguntar a outros cientistas que lhe dissessem algo que soubessem acerca da evolução; não pequenos fatos isolados em toda cadeia dessa teoria, mas pelo menos um único exemplo que contemplasse toda a cadeia evolutiva. Palestrando a biólogos no Museu Americano de História Natural na cidade de Nova York, ele disse: “Fiz essa pergunta na equipe de geologia do Museu Field de História Natural e a única resposta que obtive foi silêncio. Com membros do Seminário de Morfologia Evolucionária na Universidade de Chicago, um quadro mui prestigioso de evolucionistas, e tudo que consegui lá foi um silêncio por um longo tempo e, eventualmente, uma pessoa disse, ‘Eu só sei uma coisa - não deveria ser ensinada na escola secundária”.
O pobre Colin Petterson por ter algumas opiniões diferentes sobre o papel da sistemática na biologia é frequentemente co-optado pelos criacionistas para seus fins retóricos, mas exatamente o que a opinião de um paleontólogo (ou mesmo de um pequeno grupo de paleontólogos) sobre uma pergunta vaga (relatada por uma fonte criacionista e não a fonte original) deveria mostrar, além de vocês garimparem citações (’quote mining”) e as retiram de seu contexto supostamente acreditando que servem como argumentos anti-evolução, mas no máximo não passam de argumentos de autoridade.
Isso me lembra da famosa pausa de Richard Dawkins ao ser interpelado por criacionistas sobre mutações que confeririam nova informação genética. A pergunta foi feita por criacionistas em uma entrevista agendada sob falso pretexto e Dawkins julgava estar sendo conduzida por um grupo de repórteres realmente interessado em evolução. A pausa se deve mais a indignação com o golpe do que com a não existência de tais mutações. Dawkins responde a questão em um artigo publicado no site do Australian Skeptics com bastante cuidado pois a pergunta é viciada, partindo de uma série de equívocos e confusões conceituais sobre a Teoria da Informação de Shannon [Veja estas respostas aqui, aqui, aqui e aqui] e no que sabemos sobre mutações que estão por trás da origem de novos genes, circuitos genéticos e responsáveis por novas funcionalidades e estruturas.
Chandrasekaran , C. & Betrán , E. (2008) Origins of new genes and pseudogenes. Nature Education 1(1)
3)-Caso a evolução fosse factual, a evidência fóssil certamente revelaria a mudança gradual de uma espécie de vida em outra. E isso teria de dar-se, sem considerar que variedade da teoria de evolução se aceita. Mesmo os cientistas que crêem nas mudanças mais rápidas associadas com a teoria do “equilíbrio pontuado” admitem que ainda teriam passado muitos milhares de anos em que supostamente ocorreram tais mudanças. Assim, não é razoável crer que não haveria necessidade alguma de fósseis de ligação.
Este argumento não faz sentido pois a fossilização é um evento raro e apenas parte das biotas são amostradas neste processo. Não se espera que indivíduos de todas as gerações sejam amostrados no registro fóssil e, portanto, deixem vestígios até os dias de hoje. A distribuição das amostras de restos fossilizados, ao longo da coluna geológica, são, muitas vezes, por volta de 100000 a 200000 anos. O argumento também repete a velha confusão sobre o equilíbrio pontuado, desconsiderando que as 'pontuações’ são rápidas apenas do ponto de vista geológico e, portanto, da amostragem fóssil. Os eventos de especiação estudados pelos paleontólogos são estimados de ocorrerem em períodos entre 5000 a 50000 anos. Como a chegada da fase reprodutiva na maioria das espécies de invertebrados e pequenos vertebrados, por exemplo, acontece com cerca de um anos ou menos, estamos lidando com milhares ou dezenas de milhares de gerações, tempo mais do que suficiente para as mudanças morfológicas relacionadas aos eventos de especiação, como os que enquadram-se no modelo do equilíbrio pontuado (ou seja, são pequenas diferenças em forma, tamanho e apendiculação dos organismos muitas vezes óbvias apenas aos especialistas) e o tipo de especiação mais provavelmente envolvido, o alopátrico, engloba modificações em pequenas subpopulações isoladas na periferia da zona de distribuição da espécie 'parental’ em questão. Sendo assim, em pouco tempo do ponto de vista geológico, é perfeitamente possível ocorrer o tipo de mudança morfológica estudada no registro fóssil. Além disso, existem vários exemplos de espécies fósseis, como os foraminíferos por exemplo, que variam de forma realmente gradual. Portanto, seu argumento não faz sentido.
Benton, M. J. and Pearson, P. N. 2001 Speciation in the fossil record. Trends in Ecology and Evolution 16, 405-411
4)-Também, caso a evolução fosse factualmente respaldada, seria de esperar que os fósseis revelassem o início de novas estruturas nas coisas vivas. Deveria haver, pelo menos, alguns fósseis com braços, pernas, asas, olhos, e outros ossos e órgãos em desenvolvimento. Por exemplo, deveria haver barbatanas de peixes transformando-se em patas anfíbias, dotadas de pés e artelhos, e guelras transformando-se em pulmões. Deveria haver répteis com membros dianteiros transformando-se em asas de aves, com membros traseiros transformando-se em pernas dotadas de garras, com escamas transformando-se em penas, e com bocas transformando-se em bicos córneos.
Este item mostra a ignorância sobre a biologia evolutiva e sobre o processo de evolução como um todo. O problema com seu argumento é que pressupõem que deveria existir uma série linear única de ancestrais e descendentes e, além disso, precisaríamos ter registro de espécimens de cada “elo da cadeia” até os mais sutis detalhes de diferenças. Porém, além dessa demanda ser completamente irrealista, a evolução biológica não funciona desta maneira. Ela é um processo de divergência e divisão das populações, formando novas linhagens ou 'ramos’, e com alguns desses ramos adquirindo novas características ou detalhes sobre as características ancestrais enquanto outros ramos não. Essa natureza arborescente do processo de evolução das linhagens é que nos permite mesmo usando seres moderno, reconstruir parte do processo evolutivo e do padrão de relação entre as diversas linhagens. Mas como alguns dos grupos se extinguiram, para reconstruir a ordem e os passos dos eventos de transição é necessário procurar nos fósseis por seres com as características intermediarias (e não com características 'formadas pela metade’ ou quimeras bizarras entre seres modernos imaginados pelos criacionistas). Assim como, precisamos encontrar os representantes mais antigos com a característica intermediária em análise para estipular quando estes eventos aconteceram.
Os cientistas, portanto, não esperam (e jamais esperaram) encontrar fosseis de seres “semi-formados” (ou quimeras entre as formas atuais consideradas aparentadas) e muito menos consideram esses devaneios como formas intermediárias. Esta é uma invenção criacionista, fruto de sua incapacidade de compreender (ou querer compreender) o que é realmente estudado por sistematas e paleontólogos.
As formas de transição eram pertencentes a populações normais de seres vivos completamente formados, e o que se espera é que estes restos de espécimens possuam características intermediárias, isto é, em estados mais primitivos que os atuais em relação aos grupos mais derivados e mais derivados em relação aos grupos cujas características estão em um estado considerado ainda mais primitivo, no sentido de ancestral. Além disso, buscam-se fósseis que, de preferência, sejam encontrados em uma posição apropriada na coluna estratigráfica, mas mesmo isso não é tão essencial assim, pois o que interessa aos biólogos evolutivos é o estado das características em questão e sua relação com outras características que vão lhes dar as informações necessárias à reconstrução da evolução da característica em estudo.
São conhecidos vários fósseis que cumprem exatamente esses requisitos, como as séries de fósseis de artiodáctilos terrestres primitivos e os diversos cetáceos, com vários níveis de redução e modificação de apêndices, mudança da posição das narinas/orifícios respiratórios etc; e as de peixes ósseos com nadadeiras lobadas e “peixíbios” com membros/nadadeiras em vários estados de derivação em relação aos ossos equivalentes aos ossos dos membros dianteiros e traseiros e o das nadadeiras de peixes mais primitivos. Espera-se de alguém que critique um determinado campo de conhecimento que, pelo menos, o conheça, não distorcendo seus conceitos, métodos e resultados.
Higgins, P., 2011. Uso e Abuso do registro fóssil: Definição dos Termos Parte I [traduzido por Rodrigo Véras, de Higgins, P., 2006. Use and Abuse of the Fossil Record: Defining Terms. Creation and Intelligent Design Watch, hosted by the Committee for the Scientific Investigation of Claims of the Paranormal.] evolucionismo.org. Acessado em 27/05/2011.
Higgins, P., 2011. Uso e Abuso do registro fóssil: o caso do “Peixíbio” Parte II [traduzido por Rodrigo Véras, de Higgins, P., 2006. Use and Abuse of the Fossil Record: The Case of the ‘Fish-ibian’ Creation and Intelligent Design Watch, hosted by the Committee for the Scientific Investigation of Claims of the Paranormal.] evolucionismo.org. Acessado em 27/05/2011.
5)-Após todo esse tempo, e a coleta de milhões de fósseis, o que diz agora a documentação fóssil? O evolucionista Steven Stanley declara que tais fósseis “revelam novas e surpreendentes coisas a respeito de nossas origens biológicas”. O livro A View of Life (Uma Visão da Vida), escrito por três evolucionistas, adiciona: “Os fósseis estão repletos de tendências que os paleontólogos não conseguem explicar.” O que é que tais cientistas evolucionistas têm achado tão ‘surpreendente’ e que “não conseguem explicar”?
Mais uma vez temos apenas uma citação fora de contexto que é utilizada para confundir, como se ela implicasse em algo muito diferente do intencionado pelo autor que não levanta qualquer duvida sobre a factualidade da evolução.
Aqui o autor confunde o FATO da evolução, com as explicações para estes fatos, isto é a TEORIA da evolução. A existência dos fósseis e especialmente das formas de transição que completam as lacunas da sistemática e taxonomia (que são ainda mais corroboradas por estudos genéticos e biogeográficos) são evidências que as espécies mudaram ao longo do tempo e que são aparentadas, portanto, corroborando a descendência com modificação e ancestralidade comum destes seres, a base do fato da evolução.
Nas últimas três ou quatro décadas a paleobiologia foi renovada pelo interesse em e pela explicitação de vários padrões na distribuição, taxas de surgimento e extinção de linhagens e em sua abundância relativa que trouxeram novos debates e novas questões à mesa. A principal discussão, entretanto, é se os modelos de mudança ao nível das populações seriam capazes de explicar tais padrões ou se seria necessário lançar mão de outros mecanismos. Muitos paleobiólogos (como o próprio Stanley) propuseram várias explicações e mecanismos alternativos completamente naturais que se propunham dar conta dessas tendências e padrões e que seriam, portanto, complementares aos mecanismos que operam dentro das populações.
Entre os mecanismos que operariam especificamente durante a macroevolução estariam a 'seleção de espécies’ e a 'triagem de espécies’ que explicaria algumas dessas tendências macroevolutivas como o fato de certas linhagens (espécies ou táxons mais inclusivos) existirem por muito tempo antes de se extinguirem e/ou dividam-se em outras linhagens mais frequentemente que outras devido a propriedades coletivas das linhagens e não dos indivíduos que as compõem que operariam em paralelo ao processos microevolutivos com os estudados pela genética e ecologia de populações.
O Equilíbrio Pontuado (EP) também parece ser adequadamente explicado por um conjunto de mecanismos microevolutivos associados a modelos de especiação geográfica, especialmente as 'pontuações’, ou seja, os (geologicamente) rápidos 'surtos’ de divergência morfológica ligados a especiação. Parece também ser bastante consensual atualmente entre os paleontólogos e geneticistas que grandes populações seriam escudadas contra 'grandes’ mudanças evolutivas promovidas tanto por seleção natural como por deriva genética. Em populações menores (e às margens da distribuição geográfica da meta-população principal, talvez mesmo, em regiões nas quais o ambiente esteja em rápida alteração), entretanto, a mudança evolutiva pode tornar-se mais fácil, permitindo que estas subpopulações divirjam rapidamente e, caso estejam isoladas reprodutivamente das demais, consigam estabilizar as diferenças morfológicas, tornando-se assim espécies separadas. É exatamente por isso que a mudança morfológica estaria associada aos eventos de cladogênese, isto é, de especiação, o que resultaria no típico padrão EP. Além disso, a inércia das grandes populações em relação a grandes mudanças que resultaria na 'estase’ (o 'equilíbrio’ do EP) pode ser também explicada por processos bem dentro do escopo da biologia convencional moderna (seleção estabilizadora envolvendo rastreamento de habitas e seleção dêmica multi-direcional com “ganho liquido” próximo ao zero) e também ao levar-se em conta a existência de sistemas de canalização genético-desenvolvimentais que restringem as mudanças possíveis.
No entanto, é o que o EP possibilita, a coexistência de 'espécies filhas’ e 'descendentes’ em um mesmo espaço geográfico (especialmente após a expansão da subpopulação periférica,a gora nova espécies, para a zona principal de distribuição da espécie 'mãe’) e em um mesmo tempo, que constitui seu principal impacto nos debates sobre evolução, nos levando a considerar os mecanismos macroevolutivos antes mencionados (seleção e triagem de espécies e de clados mais inclusivos). O EP, por si só, entretanto, parece estar dentro do escopo dos mecanismos microevolutivos tradicionais intra-populacionais, não demandando processos e mecanismos adicionais.
A existência de lacunas no nosso conhecimento é absolutamente normal e uma condição necessária para que se conduza e continue a pesquisa científica. A existência de diversos modelos, hipótese e teorias explicativas, com vários níveis e graus de apoio empírico, somente demonstram que o campo científico em questão está absolutamente saudável e em pleno progresso, algo que não pode ser dito do pastiche de ciência chamado criacionismo. As disciplinas científicas avançam desta forma, levantando e explicando novos fatos empíricos e enfrentando questões conceituais a medida que novas problemas surgem. É assim que a investigação científica se dá [Veja por exemplo aqui].
Pigliucci, Massimo. Is there such a thing as macroevolution? Skeptical Inquirer 31.2 (2007): 18+.Academic OneFile. Web. 27 Nov. 2010.
Arthur W. Editorial: From the horseman’s mouth. Evol Dev. 2000 Mar-Apr;2(2):61-2. PubMed PMID: 11258390.
Erwin DH. Macroevolution is more than repeated rounds of microevolution. Evol Dev. 2000 Mar-Apr;2(2):78-84. PubMed PMID: 11258393.
Jablonski, David (2008). Species Selection: Theory and Data Annual Review of Ecology, Evolution, and Systematics, 39 (1), 501-524 DOI: 10.1146/annurev.ecolsys.39.110707.173510
Leroi AM. The scale independence of evolution. Evol Dev. 2000 Mar-Apr;2(2):67-77. Review. PubMed PMID: 11258392.
Wilkins, John (2006) Macroevolution: Its Definition, Philosophy and History The Talk.Origins Archive. Version 2.1.3;Last Update: September 23, 2006.
Theobald, Douglas (2004) Scientific “Proof”, scientific evidence, and the scientific method ; in Theobald, Douglas L. “29+ Evidences for Macroevolution: The Scientific Case for Common Descent.” The Talk.Origins Archive. Vers. 2.83. 2004. 12 Jan, 2004.
6)-O botânico sueco, Heribert Nilsson, descreveu a situação do seguinte modo, após 40 anos de suas próprias pesquisas: “Não é sequer possível fazer uma caricatura duma evolução, à base de fatos paleobiológicos.
Mais uma citação retirada de seu contexto original e que, por isso, não nos permite saber sobre o que o autor está falando exatamente; e sem saber do que Nilsson fala exatamente, não podemos daí concluir qualquer coisa. Isso é mera fumaça para distrair a falta de evidências positivas para o modelo criacionista ou mesmo de um simples e bem articulado programa de pesquisa.
7)-O material fóssil é agora tão completo que a falta de séries transicionais não pode ser explicada por se lançar a culpa na escassez de material. As deficiências nos ELOS são reais e vemos jamais terão explicações plausíveis e prováveis”
Outra afirmação solta e que sem maiores detalhes (como o fornecimento de fontes adequadas) só ocupa espaço e não estabelece nada. Os fósseis de formas transicionais abundam e existem várias séries muito completas, ilustrando diversas dessas transições; mas, claro, existem lacunas e períodos em que a amostragem de fósseis é bem pior do que em outros. Mesmo assim quando paleontólogos falam de incompletude de 'intermediários’ referem-se, na maioria das vezes, aos intermediários entre espécies próximas e não entre os grandes táxons que documentam as grandes inovações morfológicas evolutivas entre plantas e animais, por exemplo. Os criacionistas confundem o tempo todo essas questões e empregam citações dos cientistas referentes a este segundo tipo de questão (intermediário entre espécies próximas) como se fossem uma admissão de lacunas intransponíveis no registro de grandes transições morfológicas que são as que nos permitem reconstruir a história das mudanças morfológicas dos seres vivos. Estas são de fato abundantes. É exatamente esta questão envolvendo padrões de especiação no registro fóssil que levou a proposta do Equilíbrio Pontuado nos anos 70 por Niles Eldredge e S.J. Gould.
Lieberman, Bruce S. and Eldredge, Niles (2008) Punctuated equilibria, Scholarpedia, 3(1):3806.
Theobald, Douglas (2004) 29+ Evidences for Macroevolution: The Scientific Case for Common Descent.“ The Talk.Origins Archive. Vers. 2.83. 2004. 12 Jan, 2004.
8)-QUANTO AO INÍCIO DA VIDA - No livro A Guided Tour of the Living Cell (Visita à Célula Viva), o cientista ganhador do Prêmio Nobel Christian de Duve admite: “Comparando a probabilidade do surgimento de uma célula bacteriana à probabilidade de seus componentes atômicos se juntarem por acaso, percebe-se que nem A ETERNIDADE seria suficiente para produzir uma célula dessas.” Os cientistas descrevem o cérebro humano como a mais complexa estrutura física do Universo conhecido.
Esta estimativa é irrelevante pois nenhum cientista que trabalha com pesquisas sobre a origem dos primeiros seres vivos, postula que os primeiros sistemas auto-replicantes ou as primeiras protocélulas surgiram desta maneira, isto é, em um único passo a partir da agregação aleatória de seus componentes. Isso é simplesmente ridículo e é um dos piores espantalhos que se pode fazer dos reais modelos desenvolvidos e avaliados e evidências investigadas por cientistas que pesqisam a origem dos seres vivos.
O pobre de Duve tem plena consciência que as modernas teorias da abiogênese não postulam que o primeiro ser vivo tenha sido uma bactéria moderna e que tenha sido formado pela simples junção de seus componentes de forma completamente aleatória. Em seus livros ele explora vários dos cenários propostos pelos cientistas para a abiogênese que, como mencionado, envolvem várias etapas: primeiro a origem das primeiras moléculas orgânicas, depois a origem dos primeiros biopolímeros (como peptídeos e ácidos nucleicos, como o RNA, ou moléculas ainda mais simples, como o PNA e o TNA), seguidas ou precedidas pela formação dos primeiros sistemas autocatalíticos e de vesículas orgânicas e que, por fim, seriam seguidos pela origem de sistemas replicantes simples de polímeros (que seriam originalmente fruto de catálise mineral e/ou dos sistemas de reações auto-catalíticas mencionados que, por exemplo, se dariam em fumarolas subaquáticas), sendo estes sistemas, então, capturados pelas vesículas formando, desta maneira, as primeiras protocélulas.
Cada uma dessas etapas hipotéticas certamente envolve elementos probabilísticos, mas não podem ser consideradas produtos do 'mero acaso’, em nenhum sentido realmente importante, pois dependem da interação química entre componentes mais básicos que ocorreram em circunstâncias geoquímicas e geofísicas específicas que delimitam a cinética das reações, colaborando também com a concentração de componentes, e que são constantemente 'alimentadas’ com energia e matéria de fontes como as tempestades elétricas, a radiação UV (proveniente do sol), ou geotérmica, como as oriundas de fumarolas e hidrotermas batiais. [Veja mais sobre a pesquisa sobre a origem da vida aqui e aqui]
Musgrave, Ian [Last Update: December 21, 1998] Lies, Damned Lies, Statistics, and Probability of Abiogenesis Calculations The TalkOrigin Archive, acessado em 24/12/2010.
Carrier, R. C. 2004 The argument from biogenesis: Probabilities against a natural origin of life Biology and Philosophy Volume 19, Number 5, 739-764, DOI: 10.1007/s10539-005-6860-1
9)-Imagine que o mais perito cientista do mundo pudesse manejar moléculas como um pedreiro maneja os tijolos, e que ele só dispusesse de uma pilha de proteína com que trabalhar. Crê que ele poderia criar uma célula de centenas de milhões de tais moléculas? Poderia fazê-la viver, crescer, propagar-se e deixar à sua descendência suas próprias, e somente as suas próprias, características? É claro que não poderia.
Mais uma vez este item só fornece um espantalho. De novo, há a pressuposição de que o processo ocorreria através de um único passo; tendo como alvo uma célula moderna e relativamente complexa. Mas os cientistas que investigam esta área propõem etapas e processos bem mais sutis e que levam em conta o contexto geofísico e geoquímico da terra primitiva e nosso conhecimento sobre física e química. Mais sobre isso no comentário ao item 10, mas antes de uma olhada nessa resposta do form.
10)-Mas, segundo a crença ateísta, aquilo que nem mesmo a mais perita inteligência humana pode realizar, ocorreu por mero acaso. Quão bem fundamentada é tal crença? A única conclusão é que os que crêem nela devem ter um extremo desejo de crer em um só sentido, e recusam crer em outro sentido.
Falso! Como já argumentei os cientistas não supõem que uma célula moderna perfeitamente acabada tenha surgido de uma única vez. Contudo, talvez o mais interessante e irônico, seja o fato que vários cientistas estão 'montando’ células de forma artificial em laboratório a partir de componentes separados. Este novo campo chama-se Biologia Sintética. Recentemente o grupo de J. Craig Venter - o, na época, C.E.O. da CELERA genomics, a companhia que, juntamente ao consórcio publico, seqüenciou o genoma humano - sintetizou um genoma totalmente in vitro e o introduziu em uma célula bacteriana que tivera seu material genético original removido. Em algumas gerações todos os componentes estarão se originando das 'instruções’ contidas no genoma artificial. O projeto do genoma minimo também é relevante pois os pesquisadores envolvidos nele buscam criar um microorganismos com o menor número de genes possíveis com base nas informações de estudos filogenéticos de genes de 'manutenção caseira’(housekeeping) e de controle de informação (duplicação, transcrição e tradução) de vários microorganismos modernos para descobrir os genes mais conservados que poderiam estar presentes no ultimo ancestral comum universal.
Gibson DG, Glass JI, Lartigue C, Noskov VN, Chuang RY, Algire MA, Benders GA, Montague MG, Ma L, Moodie MM, Merryman C, Vashee S, Krishnakumar R, Assad-Garcia N, Andrews-Pfannkoch C, Denisova EA, Young L, Qi ZQ, Segall-Shapiro TH, Calvey CH, Parmar PP, Hutchison CA 3rd, Smith HO, Venter JC. Creation of a bacterial cell controlled by a chemically synthesized genome. Science. 2010 Jul . [Veja o vídeo no site do The Guardian e o site de Venter]
Glass JI, Assad-Garcia N, Alperovich N, Yooseph S, Lewis MR, Maruf M, Hutchison CA 3rd, Smith HO, Venter JC. Essential genes of a minimal bacterium. Proc Natl Acad Sci U S A. 2006 Jan 10;103(2):425-30. Epub 2006 Jan 3. PubMed PMID: 16407165; PubMed Central PMCID: PMC1324956. 2;329(5987):52-6. Epub 2010 May 20. PubMed PMID: 20488990.
Por isso não é preciso de fé, pelo menos, no mesmo sentido que os criacionistas têm que sua divindade criou o universo de forma completamente sobrenatural. Basta conhecer as evidências e os métodos das ciências (sem distorcê-los e sem representá-los de forma equivocada) como fazem, além de ateus, agnósticos e panteístas, muitos teístas e deístas (que acreditam tanto em uma divindade transcendente como na evolução biológica, e na origem da vida e do universo por mecanismos naturais) e que investigam de maneira cuidadosa e metódica a natureza. Com a diferença que os teístas e deístas postulam que tais leis e processos naturais tenham por traz "o toque” de sua divindade de preferência, o que os ateus acham supérfluo, improvável ou incoerente e os agnósticos abstém-se de opinar conclusivamente. Mas o ponto crucial desta questão é que para os cientistas enquanto tais (ou seja para a ciência em um sentido mais amplo) estas conjecturas são irrelevantes pois entidades sobrenaturais tais como as postuladas pelos teístas, por definição, ao transcenderem nossas capacidades de compreensão, não se prestam a investigação científica não oferecendo explicações adequadas aos interesses dos pesquisadores, possuindo eles ou não fé religiosa. Por isso os cientistas adotam o chamado Naturalismo Metodológico [Veja aqui].
11)- Quando nos fechamos em nossos julgamentos, desqualificamos qualquer argumento,e invalidamos qualquer prova, mesmo que convincente, que não se ajustem a eles. Nada que mereça ser chamado de verdade pode ser alcançado por este método.
Está descrição é muito mais apropriada a forma displicente e pouco rigorosa com que os criacionistas tratam as informações científicas, ao distorcerem-nas para construir seus argumentos todos cheios de furos e espantalhos das posições científicas. Enquanto exigem toda sorte de evidências, façam elas sentido ou não, e insistem que estas sejam fornecidas em um absurdo nível de precisão e detalhe, os criacionistas são incapazes (através do seu modelo) de nos mostrar qualquer evidência para a existência (ou necessidade) ou esboçar qualquer mecanismo para ação do seu “Criador”. Argumentam pelo “Deus das lacunas”, recusando-se a ir adiante e fazer ciência de verdade já que ao primeiro sinal de dificuldades dos cientistas declaram ter provado o criacionismo e refutado as conclusões da ciência moderna que chocam-se aos seus ensinamentos, como a evolução. É por causa dessa esterilidade como programa científico e da vacuidade de sua teoria que a imensa maioria dos pesquisadores em áreas como a cosmologia, geologia, astronomia, paleontologia e biologia evolutiva - mesmo os religiosos e crentes em uma divindade transcendente - viram as costas ao criacionismo pois este não oferece qualquer perspectiva real de compreensão científica dos fenômenos, mas simplesmente aposta em nossa eterna ignorância e, presunçosamente, quer que chamamos isso de ciência e a ensinemos nas escolas com tal.
Detalhes Adicionais
Prezados,
Sei que o texto é longo, mas, Leiam e vejam que meus argumentos não se baseiam na fé, mas em Fatos e dados Científicos.
Infelizmente o texto é longo em retórica, mas é curto em fatos e argumentos. Os [pseudo]argumentos apresentados podem até não ser 'baseados na fé’, mas não oferecem qualquer hipótese substantiva e evidências para ela em favor da existência de tal entidade criadora que não utiliza processo naturais, como os que são estudados pela biologia evolutiva. Entretanto, certamente baseiam-se muito menos na moderna filosofia e ainda menos nas ciências naturais. No máximo, baseiam-se na distorção destas disciplinas, dos seus métodos, conceitos e conclusões.
Os argumentos parecem, no entanto, 'partir’ sim da fé, mas de uma fé cega, em que o criacionista define de antemão o que está certo e se alimenta da desinformação sobre a evolução biológica e seu estudo científico para tentar persuadir os desavisados.
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Grande Abraço,
Rodrigo