Sunday March 31, 2013
Anonymous: É verdade que existem assinaturas de ERVs nos mesmos pontos do nosso genoma e de outros símios?
Respondendo a sua pergunta: Sim, muitos ‘retrovírus endógenos’ (ERVs), compartilhados entre os diversos primatas (nós inclusos), encontram-se em posições, ou loci, equivalentes, virtualmente idênticas, nos diversos genomas das diversas espécies de primatas, mas essa é só parte da história.
Para começarmos a compreender melhor o porquê disso, primeiro precisamos entender o que são os ERVs e como eles se originaram. Estas sequências genômicas que compreendem cerca de 8% do genoma humano são , na realidade, o resultado em infecções de células das linhagens germinativas por retrovírus exógenos em nosso passado evolutivo que ocorreram em diversos pontos da história de nossa linhagem [1]. O esquema a seguir ilustra o processo de formação de provírus endógenos que ocorre quando um retrovírus infecta uma célula (A), e seu genoma é copiado para o de DNA genômico em uma sequência que é flanqueada pelas chamadas LTRs (do inglês ‘Long Terminal Repeats’), ou ‘repetições terminais longas’ que no esquema são mostradas quadrados [2]. Estas repetições, que são os elementos diagnósticos destes retrovírus possuem sequências, são, no momento, de sua inserção idênticas, com estes segmentos de DNA sendo integrados em locais mais ou menos aleatórios, especialmente em relação aos cromossomos do genoma do hospedeiro, formando um pró-vírus.stória.
Quando a célula infectada pelo DNA viral faz parte da linhagem germinativa - por exemplo, sendo um precursor dos espermatozoides ou óvulos - estas inserções poderão ser passadas adiante às futuras gerações, sendo, então, encontrads no zigoto, passando às células descendentes durante o desenvolvimento, estando, por fim, presente em todas as células do indivíduo adulto, como mostrado em (B, C, D e E) [2]. Assim é possível inferir a ocorrência destas infecções por retrovírus ancestrais em diversos ponto da história de nossa linhagem. Por exemplo, caso um vírus tenha infectado um ancestral comum dos primatas hominoídes (que incluem além de nós humanos, os chimpanzés, bonobos, gorilas, orangotangos e gibões) tornando-se fixado como provírus endógenos nos genoma deste ancestral comum, ele será herdado por todas as espécies descendentes. Então, como explicam Theobald e Coffin [2, 3], como existe uma gigantesca gama de locais de integração possíveis no genoma, a presença do vírus na população ancestral comum pode ser claramente inferida a partir da presença de provírus em espécies estreitamente relacionadas, no mesmo local, em todas as espécies modernas e da sua ausência em espécies menos aparentadas.
Estes eventos de inserção destes retrovírus como são, além de raros, basicamente aleatórios (sendo herdados pelos descendentes do organismo cujas células germinativas foram infectadas), quando encontrados em posições idênticas nos cromossômico equivalentes de diferentes espécies, como explica Douglas L. Theobald [3], servem como uma fortíssima evidência de ancestralidade comum. Segundo, Theobald [3], existem pelo menos 7 diferentes exemplos de inserções de ‘retrogenes’, nas mesmas posições em chimpanzés e seres humanos*. Na figura retirada de Coffin [2] podemos ver como triângulos invertidos os tempos estimados (em milhões de anos antes do presente) da divergência entre os vários ramos representando linhagens distintas.
Note bem, entretanto, que todos os ramos após a inserção (ou seja, as linhagens descendentes) compartilham aquela inserção, o que faz com que o compartilhamento de mais ‘retrogenes’ em loci específicos esteja associado com o grau de parentesco evolutivo. Isso quer dizer que os ERVs não são apenas compartilhados entre os primatas, mas os compartilhamentos destas sequências são maiores quando maior a proximidade evolutiva dos grupos, ou seja, quanto mais recentes forem os ancestrais comuns e menor for o tempo de divergência das linhagens. Isso gera uma ‘hierarquia aninhada’ (‘nested hierarchy’), típica do padrão evolutivo, com grupos dentro de grupos dentro de grupos [3, 4]. Além disso, como chama a atenção [4], quanto maior a distância evolutiva entre os grupos, maior o nível de variação entre os ‘retrogenes’ homólogos, pois mais eventos mutacionais ocorreram naquelas sequências (que eram identicas durante sua inserção original) desde a divergência entre as linhagens. Por fim, algumas das mesmas mutações que diferenciam ‘retrogenes’ específicos de uma linhagem dos da outra que surgiram após a separação destas linhagens, são herdadas pelas linhagens descendentes. Conjuntamente, estas evidências são algumas das mais persuasivas para a ancestralidade comum. Como se todas as outras já não bastassem.
Na figura acima é mostrada uma árvore filogenética de vários primatas, incluindo nós, seres humanos, extraída de um estudo feito por Lebedev et al. [5] [apud Theobald, D. L., 2012] em que são mostradas várias dessas inserções compartilhadas por estes vários primatas. As setas indicam os tempos relativos de inserção do DNA viral nos genomas dos hospedeiros e os nomes dos loci onde estas inserções ocorreram.
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*Na realidade, de acordo com [4]em virtude da quantidade de inserções e deleções que diferenciam os genomas dos chimpanzés e seres humanos e de outras informações sobre o padrão dos genomas e a distribuição destes retrogenes é possível estimar compartilhamos a imensa maioria de nossos ‘retrogenes ‘com os chimpanzés.
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Literatura Recomendada:
Mayer, Jens (Mar 2013) Endogenous Retroviral Sequences; Their Evolutionary Contribution to the Human Genome. In: eLS. John Wiley & Sons Ltd, Chichester. [doi: 10.1002/9780470015902.a0020825.pub2]
Coffin JM. Evolution of retroviruses: fossils in our DNA. Proc Am Philos Soc. 2004 Sep;148(3):264-80. PubMed PMID: 15551500.
Theobald, Douglas L. ‘Prediction 4.5: Molecular evidence [parte IV] - Endogenous retroviruses’ In Theobald, Douglas L. “29+ Evidences for Macroevolution: The Scientific Case for Common Descent.” The Talk.Origins Archive. Vers. 2.89. 2012. Web. 12 Mar. 2012.
“Three Layers of Endogenous Retroviral Evidence for the Evolutionary Model.” Evidence for the Evolutionary Model. Nov. 2009. Web. [acessado em 31 de março, 2013.].
Lebedev YB, Belonovitch OS, Zybrova NV, Khil PP, Kurdyukov SG, Vinogradova TV,Hunsmann G, Sverdlov ED. Differences in HERV-K LTR insertions in orthologous loci of humans and great apes. Gene. 2000 Apr 18;247(1-2):265-77. PubMed PMID:10773466.
Grande abraço,
Rodrigo